De acordo com dados do Observatório de Economia e Gestão de Fraude, a economia paralela em Portugal representava, já em 2015, aproximadamente 27,29% do PIB. Precisamente nesse ano (2015), por exigência da "troika", foram recrutados mais mil inspectores para a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT). A "troika", composta pela Comissão Europeia, BCE e FMI, com o país à beira da banca rota, não exigiu nem mais professores, nem médicos, nem nenhum outro tipo de trabalhadores na FP, apenas mais inspectores.
Esperava-se, compreensivelmente, uma significativa melhoria no combate à fraude e evasão fiscal. Mas, atente-se nos relatórios oficiais (feitos pelo Governo) respeitantes ao período entre 2015 (ano - recorde-se - do reforço de inspectores na AT) e 2023, para se perceber que isso não aconteceu! Pelo contrário, não só não parámos a sangria como a deixamos agravar. E porquê? Porque esses recursos humanos foram desviados para outras funções e não nos deixam trabalhar! Repare-se que foi através do próprio relatório do ano 2023, divulgado recentemente, que soubemos que a IGF sugere, que a AT crie um plano de acção integrado para o controlo de arrendamentos! Então é necessário ser a IGF a alertar para algo tão óbvio?! Os sindicatos têm alertado para esta e muitas outras evidencias de trabalho que a AT devia fazer e não faz. Certo é que em parte isso é justificado pela falta de recursos humanos e materiais, mas não só. A realidade é que em vez de ajudar os inspectores e gestores tributários e aduaneiros a fazer o seu trabalho a AT tem criado mecanismos e regras que prejudicam e dificultam esse trabalho.
Em meados do ano passado foi notícia que a economia paralela em Portugal bateu novo recorde no peso do PIB. Um estudo da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, tendo por base um artigo científico e dados actualizados, conclui que o peso da economia não registada no PIB deverá ter atingido um novo recorde de 34,37% em 2022, o correspondente a 82.232 milhões de euros. Quanto tempo levará a atingir os 100 mil milhões?
Como é possível, no discurso político, não se perceber que sem uma AT forte não haverá nem estado social, nem justiça, nem educação, nem saúde, nem segurança, nem sequer democracia? Com o mundo em guerra, a classe política parece também querer criar um conflito interno com os inspetores e gestores tributários e aduaneiros. O BCE, o FMI e a Comissão Europeia, aparentemente, tinham uma visão distinta da importância deste sector específico do Estado. Reis e imperadores, desde o princípio da história, também.
Há anos que venho alertando para a total destruição da Autoridade Tributária e Aduaneira e, no seu seio, sobre a questão premente das suas funções de autoridade.
As funções de autoridade na AT têm múltiplas vertentes e são executada, ou deveriam ser, a vários níveis, pelos seus trabalhadores das carreiras especiais inspectivas, desde logo na fronteira externa da União Europeia!
Em Dezembro de 2022, numa carta-aberta, alertei o Sr. Primeiro-Ministro para o facto do Governo permitir que a AT coloque inspectores do Estado português a executar funções que nada têm a ver com o seu conteúdo funcional, desperdiçando recursos públicos.
A verdade é que o Governo anterior desvalorizou as carreiras especiais quando comparadas com as carreiras gerais e delapidou a autoridade da AT aos olhos da sociedade. Pergunta: O que vai fazer o actual?
De norte a sul do País, embora de forma mais recatada, por razões profissionais, dirigentes e trabalhadores vêm avisando, de forma insistente, para um desfecho cada vez mais inevitável: O colapso da AT!
O actual Governo vai continuar a fingir que está tudo bem, como fez o anterior? Ou está a classe política governativa finalmente disposta a ouvir quem sabe, quem tem experiência no terreno e décadas de trabalho acumulado no combate à fraude e evasão fiscal, à criminalidade económica e à corrupção?
A verdade é que, apesar dos alertas, a justiça fiscal é cada vez menor em Portugal. Sem justiça fiscal é impossível existir justiça social. Até quando vão os partidos que nos governam enterrar a cabeça na areia e continuar a ter uma AT em conflito, instável e desmotivada?