Cão de raça podengo português. Estatura média. Canal auditivo esquerdo tapado. Na box com outros cães desde 2016. Dócil. Personalidade estruturada. Sem nome. Conversado com o pessoal do canil que o conhecia estabeleceu-se um consenso que seria este o cão ideal para dar uma vida nova aos meus pais — seriam obrigados a passeá-lo pela rua, agora que no seu infinito amor pelos animais já tinha feito o luto do “Sherlock” que morrera aos 16 anos — e uma vida nova e boa para o “podengo sem nome”. Uma combinação perfeita. Tinha sido uma decisão colegial da família e do médico que em Lisboa segue os meus pais. Sim, um cão dar-lhes-ia um objetivo diário para passear. À chegada a Ferreira do Alentejo a surpresa — um cão? —, e minutos depois o “cão sem nome” já tinha sido batizado “Milagre” — que se mostrava um pouco apático, natural dada a mudança radical. Demos-lhe banho e ficou entregue às melhores das pessoas. Nessa noite dormiu aos pés do meu pai enquanto via TV, e ficou na sala numa cama herdada. De manhã a minha mãe deu o primeiro passeio curto pelas redondezas e voltaram para casa. Pelas 10 da manhã tocaram à porta. Conversa e tal. “Milagre” viu a primeira oportunidade e fugiu por entre as pernas. E correu desalmadamente em direção ao exterior da vila. Em desespero acionou a minha irmã e sobrinhas e amigos e um grupo de busca. Umas horas depois foi detetado. Num barranco perto, dentro de um canavial. Tentaram apanhá-lo. De forma acrobática escapou para dentro do olival. Foi efetivamente a última vez que foi visto. Faz no momento em que escrevo uma semana.
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