Portugal terá que gerir, nos próximos anos, uma crise económica profunda. Para a ultrapassar é essencial definir objectivos para o País, planos estruturais para os alcançar, mas acima de tudo garantir a sua concretização. O nosso País tem sido fértil em óptimos planos, mas com muito menos tracção do que o necessário na implementação.
Qualquer evolução da economia depende da dinâmica das empresas. A primeira condição é um enquadramento regulatório ágil e rápido. Ao Estado caberá o papel de regulador e facilitador da actividade empresarial, nos diferentes sectores de actividade. Às empresas caberá criar o valor.
Não se consegue acreditar que o Estado se possa substituir a centenas de milhares de decisões privadas, nem sequer poderia, uma vez que neste século demonstrou não ter essa capacidade.
Portugal será atractivo, para o investimento nacional e estrangeiro, apenas num contexto desburocratizado e de economia de mercado. Este ponto é mais importante quando os desafios que temos pela frente implicam o desenvolvimento de áreas de investimento intensivo. A agilidade do sistema que formos capazes de criar será crucial, para que Portugal integre a vaga de países que crescem e sobrevivem à nova ordem mundial.
Este desígnio de criar riqueza nacional tem-nos escapado há 50 anos e, sobretudo, neste século. Não podemos nunca deixar esquecer que só a Grécia e a Venezuela caíram mais, como economias no ranking mundial, do que Portugal. Este facto demonstra a dimensão da tarefa que se nos depara: recuperar ritmos de crescimento que perdemos há meio século.
Destacaria dois eixos de entre os que me parecem inevitáveis e transversais à recuperação económica: a Sustentabilidade e a Transição Digital.
A sustentabilidade tem que ser assumida como um sine qua non da nossa agenda económica. A visão e a construção do futuro têm que passar pela diminuição dos impactos ambientais das pessoas e dos negócios no planeta. O mundo não tolerará a prazo, empresas que para crescer criem danos irreparáveis nos sistemas em que estão envolvidas. Não é admissível, nem sustentável a rentabilidade a todo o custo e os resultados assim obtidos serão, inevitavelmente, perenes.
A poluição é um problema global que as empresas serão chamadas a endereçar e resolver. A questão particular dos plásticos é um tema a que prestamos especial atenção na Unilever e temos assumido compromissos firmes, ao longo dos últimos anos, para uma melhor utilização deste material em toda a nossa cadeia de valor. A substituição do plástico virgem por reciclado e reciclável, faz parte do plano de sustentabilidade de todas as grandes empresas.
Até 2025 a Unilever tem como objectivo reduzir em 50% o uso de plástico virgem nas embalagens, eliminando assim mais de 100.000 toneladas deste material do planeta. O nosso contributo passa também por acelerar a inovação de produtos recarregáveis e reutilizáveis, cujo impacto será substancial a médio prazo. A este desígnio somam-se o de todas as grandes companhias. Seguramente serão estas mais concordantes nos objectivos a perseguir e na celeridade de os conseguir, do que os Estados.
Ainda neste âmbito, a União Europeia está empenhada na redução do plástico virgem, estando já em discussão a aplicação de um imposto sobre a sua utilização. A confirmar-se, vejo como essencial, que a receita proveniente do imposto seja investida na economia circular do plástico, fomentando a utilização equilibrada deste material, por um lado, mas garantindo, por outro, o financiamento de um modelo sistémico.
A diminuição da utilização do plástico reveste-se de um valor acrescido, já que este é um dos materiais que mais polui os oceanos. Segundo dados da ONU, 8 milhões de resíduos plásticos acabam todos os anos nos oceanos. E o Oceano tem um valor inestimável para Portugal, não só pela dimensão da sua zona económica exclusiva, que é uma das maiores do mundo, como pelo impacto na economia - em 2019 o mar representava 8% do nosso VAB. Para além deste valor tangível, existe uma outra dimensão de força no Mar, como agregador da nossa cultura, alicerçada no passado, mas com um enorme potencial no futuro.
Temos que ter a ambição de nos tornarmos num dos maiores protagonistas globais da economia azul, através do investimento na investigação e preservação dos recursos marinhos, biotecnologias, indústrias alimentar, farmacêutica e cosmética, ou de energias renováveis, e sermos competitivos nestas novas áreas de desenvolvimento dos negócios.
A transformação digital é outra área incontornável para a economia do nosso país. A evolução permanente das tecnologias e a generalização do teletrabalho, quer na administração pública quer no sector privado, vão obrigar à capacitação das pessoas do conhecimento necessário ao exercício das suas funções e, por isso, a um investimento significativo na formação do capital humano.
No sector do grande consumo, por exemplo, para antecipar as necessidades do cliente, melhorar a gestão das cadeias de abastecimento, e assegurar uma maior eficiência na utilização dos recursos a menores custos, teremos que utilizar as novas tecnologias digitais de sensorização, análise de dados, algoritmos preditivos e inteligência artificial.
A transformação digital chegará à industrialização pela criação de unidades fabris de pequena dimensão, mais ágeis, versáteis e eficientes, recorrendo às novas tecnologias de fabrico aditivas, tais como a impressão 3D. Esta mudança de paradigma, aliada ao desenvolvimento da economia circular, particularmente adaptada a estruturas e know-how nacional, irá permitir a redução drástica da dependência e custos dos transportes de mercadorias e contribuirá para novos modelos nas cadeias de abastecimento.
Há que antecipar e ressalvar, por outro lado, os grandes riscos que a tecnologia traz às economias e aos cidadãos. Áreas como a cibersegurança ou a proteção de dados, vão requerer uma legislação que proteja os direitos fundamentais. E é em matérias como esta que o Estado deve assumir o seu papel de regulador, obrigatoriamente em coordenação estreita com as entidades privadas. O objectivo tem que ser desenhar os modelos regulatórios, caracterizados por mecanismos processuais céleres e ágeis, que garantam um ambiente favorável à inovação, promovida pelo sector empresarial privado.
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