Opinião sem cerimónia

O interior não precisa de conversa, precisa é de emprego e internet rápida

Quando hoje discutimos o 5G há uma parte do país que nem tem 1G. E isso é inaceitável

As consequências da pandemia vieram revelar um conjunto de vantagens de viver no interior do país. Hoje há milhares de portugueses, e de estrangeiros, dispostos a mudarem-se de “armas e bagagens” para o interior de Portugal onde alguns passaram os meses do confinamento. Mas para que isso aconteça é preciso que se reúnam duas condições: 1. encontrar um emprego ou passar a trabalhar em teletrabalho; 2. Ter internet com velocidade suficiente para que possam trabalhar à distância.

Quer o Programa de Recuperação e Resiliência quer os Fundos Comunitários têm como um dos seus principais objetivos fomentar a coesão territorial e financiar reformas estruturais que um país individualmente não consegue implementar ou financiar. Alargar a fibra ótica a mais regiões do país, cobrindo centenas de freguesias que por vezes nem rede de telemóvel têm, é uma dessas mudanças que ajudaria o país a ser mais coeso. Era isso que eu e outros que se preocupam com o interior e o combate ao êxodo rural gostaríamos de ter visto no PRR português ou no próximo Acordo de Parceria, o PT2030. Infelizmente essa não foi a opção do Governo de António Costa, mas esse é um erro que ainda vamos a tempo de corrigir.

É justo dizer que o primeiro grande investimento nesta matéria em Portugal foi levado a cabo no Governo de José Sócrates que, apesar de todos os disparates que cometeu, sempre teve mais coragem e visão estratégica do que o situacionista António Costa. Esse investimento na fibra ótica foi pioneiro e importante, mas falta completar a “malha” e fazer chegar esta nova “água da vida” a mais concelhos e freguesias do interior de Portugal, sim, porque o interior também é Portugal.

Quando me candidatei a líder da JSD (há 11 anos), apresentação formal feita em Tondela, disse que num futuro muito próximo, o acesso à internet seria um direito tão básico como o acesso a água canalizada ou a eletricidade. Alguns na sala riram-se. Hoje vivemos de facto essa realidade, mas há demasiados compatriotas nossos que a partir das suas habitações não têm as mesmas condições que nós para ler, escrever ou entrar numa conferência via internet. Quando hoje discutimos o 5G há uma parte do país que nem tem 1G. E isso é inaceitável.

Ainda recentemente o regulador das telecomunicações (ANACOM) procedeu a mais uma renovação das licenças “4G” a dois operadores e aproveitou, e bem, a oportunidade para alargar as imposições de cobertura do país. Isto significa que na nova atribuição dos direitos de utilização de frequências nas faixas dos 900 MHz e dos 1800 MHz atribuídos à Vodafone e à MEO estas terão de garantir a cobertura em mais 100 freguesias de baixa densidade populacional de serviço de banda larga móvel com um débito mínimo de 100 Mbps, como se poderá ler no portal da ANACOM. Por outro lado, a ALTICE tem feito um conjunto de protocolos com municípios para alargar igualmente o serviço de banda larga e a instalação de fibra ótica. Parece pouco, mas é alguma coisa. Apesar de todos estes esforços muitas freguesias ficarão ainda de fora, é por isso que defendo um esforço suplementar da parte do Governo para através dos fundos comunitários dar um “empurrão” para acelerar a cobertura de fibra ótica e abarcarmos assim mais freguesias e uma maior percentagem da população. Esse sim seria um esforço público e privado com elevado interesse público, de serviço às populações e um enorme passo por mais coesão territorial.

Nesta matéria o país não anda a duas velocidades, anda mesmo a velocidades muito diferentes conforme a região, o concelho ou a freguesia. É um país muito desigual onde há claramente filhos e enteados, e mais do que aos operadores privados compete ao Estado ajudar a corrigir estas desigualdades.

Bem sei que o sonho do 5G que está próximo, apesar de demorado, mas esta tecnologia ainda é uma incógnita e muito dificilmente antes de 2030 será suficientemente eficiente e atingirá uma cobertura de 99% que nos resolva o problema da coesão. Os portugueses precisam de passos realistas e concretos.