Economia

Um mês de guerra: Portugal financeiro com exposição reduzida à Rússia

Neste primeiro mês de guerra na Ucrânia, as autoridades de supervisão detetaram uma reduzida exposição ao país e à Rússia

José Carlos Carvalho

A invasão da Ucrânia à Rússia já fez um mês (32 dias, mais precisamente) e neste período as autoridades têm vindo a fazer contas para perceber qual a extensão dos impactos que os países podem enfrentar. Em Portugal, são os supervisores financeiros aqueles que mais informações dão sobre a exposição às economias russa e ucraniana, a primeira das quais alvo de sanções aprovadas pela União Europeia e aplicadas por Portugal. A conclusão é que há uma limitada exposição, até porque são poucas as ligações diretas entre Portugal e as duas geografias, a Rússia, invasora, e a Ucrânia, invadida. Mas a economia sofre (o supervisor da banca tirou nove décimas às projeções de crescimento para 2022, que agora ficou em 4,9%).

O Boletim Económico do Banco de Portugal, divulgado esta semana, sintetiza a relação comercial entre Portugal e a Rússia e a Ucrânia: “As ligações diretas entre Portugal e os dois países em conflito são limitadas; as exportações para a Rússia e para a Ucrânia representavam 0,4% das exportações de bens de Portugal, em média em 2015-19, e as importações correspondiam a 2% das importações de bens. A exposição é maior nos bens energéticos (petróleo e gás natural) e alimentares (cereais), nos quais a Rússia e a Ucrânia são grandes fornecedores mundiais. Entre 2015 e 2019, as importações de bens energéticos da Rússia representaram cerca de 12% das importações portuguesas desses bens e as importações de cereais da Ucrânia correspondiam a quase 17%”.

Porém, a interligação mundial e a exposição mais elevada da zona euro, onde estão os parceiros comerciais privilegiados de Portugal, aumentam o risco para o país (o impacto económico pode mesmo ser extenso através de quatro canais de impacto), mas, a nível financeiro, não há grandes motivos iniciais de alarme, como os supervisores revelaram ao longo das últimas semanas.

Banca com uma conta de sancionado russo

Na banca, a exposição é diminuta. Há apenas um banco de reduzida dimensão, o Finantia, que tem um acionista minoritário, com 12,2% do capital, de origem russa. É o segundo maior banco russo, o VTB, que está nas listas de sanções internacionais. As implicações ainda estão a ser estudadas.

A nível de sancionados russos pela UE, número que ascende aos 700 (entre empresas e particulares), há poucos casos em Portugal – ainda que Roman Abramovich seja um cidadão português, que, porém, não vive no país e não terá qualquer conta bancária no país, já que teria de ser bloqueada. Isto porque há apenas um cidadão sancionado pela UE com uma conta num banco em Portugal, uma conta com apenas 242 euros bloqueados.

As transações entre bancos portugueses e bancos russos também caíram 65% quando sete bancos russos (e sete subsidiárias) e três bancos bielorrussos foram desligados da rede de suporte de transações financeiras internacionais, o Swift.

Seguros e fundos de pensões limitados

A nível da área dos seguros e fundos de pensões, também não há grande exposição, segundo uma resposta dada pela Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) ao Expresso.

“A exposição direta das empresas de seguros sob supervisão da ASF a ativos emitidos por empresas russas, a 31-12-2021, valia aproximadamente 19 milhões de euros”, respondeu a ASF relativamente às seguradoras.

Já quando aos fundos com aplicações a emitentes russos, a “exposição direta nos fundos de pensões nacionais é residual”.

Mas a volatilidade dos mercados preocupa a ASF, devido ao impacto que poderá ter nas carteiras de investimento dos seus supervisionados.

Investidores e fundos “pouco relevantes”

“A exposição do mercado e dos investidores nacionais a entidades e ativos mais afetados pelo conflito é reduzida, e a generalidade dos mercados internacionais relevantes para Portugal, ainda que registando níveis de volatilidade mais elevados, continuam a funcionar com normalidade”, é o que revela a avaliação feita pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).

A nível de exposição direta dos fundos de investimento e carteiras individuais geridas por terceiros, bem como a exposição indireta (por via de participações em fundos estrangeiros), a CMVM concluiu que é “pouco relevante”.

Sanções obrigam a atualização

Em comum, as empresas financeiras estão obrigadas a comunicar de perto às autoridades de supervisão quaisquer alterações que possam modificar essa exposição. Não só ir monitorizando a exposição àquelas geografias, como também as empresas e fundos vão ter de continuar a olhar para as atualizações às listas de sancionados da UE, e ainda das operações que são proibidas – e aqui há a juntar a Bielorrússia, também alvo das sanções.

Na banca, há congelamento de fundos (que podem aumentar, caso haja novos bloqueios), e há impedimento de exportação de euros para a Rússia. Nos seguros, há proibição de financiamento e assistência financeira, ou concessão de seguros e resseguros para a importação de mercadorias vindas das regiões da Ucrânia de Donestsk e Luhansk, ou ainda a tecnologia para aviação ou indústria espacial.

O Expresso tentou perceber as implicações das sanções ao país junto do Ministério das Finanças e do Ministério dos Negócios Estrangeiros, autoridades nacionais responsáveis pela aplicação das sanções da União Europeia no campo financeiro, mas não obteve respostas.