É que nem sei por onde comece. Se pelas fotografias de Varoufakis e a mulher, loira e sorridente, à mesa bem posta, onde o menu para o dia era vinho branco de Santorin, saladas verdes, peixe grelhado e couvert variada. Se pela imagem do ministro das Finanças grego sentado ao piano, acordes na ponta dos dedos, mas olhar sedutor fixado na câmara. Se pela foto em que surge numa poltrona, biblioteca recheada como pano de fundo, e escolha de leitura pouco original: o seu próprio livro, aberto ao acaso e contemplado com orgulho. Se pela imagem dele a pegar nela ao colo, decote generoso e soutien a entrever-se, qual casalinho apaixonado no "ninho de amor" com vista para a Acrópole, uma das zonas mais caras da cidade. Se pela roupa de ambos, num ton sur ton de palete azul e verde a condizer com o céu, com direito a troca de indumentária durante a sessão fotográfica, não vá uma nódoa de azeite ter arruinado as vestes escolhidas com primor a pensar na objetiva.
A reportagem na intimidade do casal, publicada ontem, foi um "furo" da "Paris Match". O texto complementa a reportagem fotográfica de forma esclarecedora. "Eu desprezo o sistema do estrelato. É sempre o corolário de um défice democrático e de um défice de valores", afirma o ministro das Finanças grego. Ao mesmo tempo que vai mostrando imagens de si próprio em pequenino, sorridente e desdentado, sublinha que quer manter a sua privacidade, e que por isso vai mudar dentro de três semanas para um apartamento maior. Para quem diz que recusa o "star system", Varoufakis está a fazer de forma exemplar a sua parte para o alimentar.
Por cá temos o Pedro 1 e o Pedro 2 (como tão bem definiu Ângela Silva no texto sobre Passos Coelho e a sua conduta dicotómica, para usar um eufemismo). Na Grécia, há o Varoufakis 1 e o Varoufakis 2. O primeiro é um homem que viaja em económica, se apresenta sem gravata nas altas instâncias europeias e quer ser o cidadão comum fora do sistema que chegou ao poder para servir e não para se servir. O segundo é um fútil, vaidoso e ostensivo, para quem o apelo de palco se tornou demasiado irresistível. Um radical chic deslumbrado que afinal adora clichés, exemplar da esquerda caviar no seu esplendor.
O que pensarão os gregos disto, é o que me intriga. Verão com orgulho a nova estrela helénica, uma "rock star" com "semelhanças de Bruce Willis", "porte atlético e crânio barbeado", na definição da revista? Ou compararão com o que eles próprios vão ter para comer ao almoço, já que, como Varoufakis alega em várias instâncias internacionais, por ali se vive uma crise humanitária?
Um político não tem de viver como um monge, nem tão pouco de se fechar em casa e esconder sinais exteriores de riqueza, é certo. Mas há um meio caminho entre o comportamento à pop star e a imagem pública de um governante que conduz o país em tempos de crise severa. Não sei se faltou um "spin doctor" ao governante grego. Mas estou certa que faltou bom senso.