Sociedade

Dexametasona: o que já se sabe sobre o efeito do medicamento em doentes com covid-19

Um estudo da Universidade de Oxford, no âmbito do mega ensaio clínico Recovery, concluiu que a dexametasona consegue reduzir a mortalidade entre doentes graves com covid-19. Cientistas pedem ainda alguma cautela

Marcos Borga (MB)

O que é a dexametasona?

É um anti-inflamatório e imunossupressor da família dos esteroides muito acessível e que está no mercado há já 60 anos. É usado no tratamento de asma, reações alérgicas e artrite reumatoide. Como explicou esta semana o presidente do Infarmed, Rui Ivo, o medicamento está autorizado em Portugal há muito tempo e é “comum em várias situações” clínicas, mas não se trata de um antirretroviral.

Que efeito pode ter no tratamento da covid-19?

Um estudo da Universidade de Oxford concluiu esta semana que a dexametasona reduziu o número de mortes de doentes com covid-19 que estavam internados em estado grave. O medicamento parece ter capacidade de travar uma reação imunitária excessiva ao vírus, a chamada “tempestade de citocinas”, que resulta de um esforço exacerbado do organismo para combater o vírus e que pode levar à morte. Os investigadores dizem que após 28 dias o fármaco contribuiu para reduzir em 35% as mortes de doentes já dependentes de ventilador e em 20% nos que apenas precisavam de oxigénio. E defendem mesmo que poderiam ter sido evitadas até cinco mil mortes no Reino Unido se a dexametasona tivesse sido usada para tratar os doentes desde o início da pandemia. A investigação sobre este fármaco está inserida no megaensaio clínico Recovery, que tem estado a analisar os efeitos de uma série de fármacos, como o lopinavir/ritonavir, contra o HIV, para perceber quais são os mais eficazes no tratamento da covid-19, concluindo, por exemplo, que a hidroxicloroquina não reduz a mortalidade.

Há cientistas a pedir cautela com estes resultados. Porquê?

Porque já não é a primeira vez que surgem resultados muito positivos no efeito de um fármaco no tratamento da covid-19 mas que depois acabam por não se confirmar. A corrida às farmácias para comprar hidroxicloroquina foi um exemplo. A diretora do Centro de Prevenção e Controlo de Doenças sul-coreano, Jeong Eun-kyeong, sublinhou esta semana ao jornal britânico “The Guardian” que a dexametasona reduz a resposta inflamatória mas também “afeta negativamente o sistema imunitário”, podendo ter efeitos secundários indesejáveis.
O medicamento já é usado no tratamento de doentes graves com covid em Portugal?
O presidente do Infarmed admitiu que a dexametasona pode já estar a ser usada em Portugal no combate a casos graves da doença. “Os médicos poderão, em situações que considerem que se justifica, optar por esta administração”, apontou Rui Ivo em conferência de imprensa, indicando que nos primeiros quatro meses deste ano foram usadas 200 mil unidades do fármaco. Ainda assim, o responsável também pediu “cautela” na interpretação dos resultados do estudo, aconselhando a aguardar por mais dados para “conhecer em detalhe quais as condições que devem ser consideradas na administração destas terapêuticas nestes doentes”. No Reino Unido, logo após a divulgação do estudo, o ministro da Saúde britânico garantiu que o Governo já está a trabalhar para incluir a dexametasona “como parte do tratamento padrão” para a covid-19.

O que diz a Organização Mundial de Saúde (OMS)?

O diretor da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, apontou a dexametasona como o “primeiro tratamento comprovado que reduz a mortalidade em doente com covid a precisar de oxigénio ou ventilador”, mas no final desta semana os peritos lembraram que não se trata de um medicamento que funcione como prevenção contra o vírus e que só “ deve ser usado em doentes graves”.