Dois anos antes de disparar um tiro de revólver na cabeça, Camilo Castelo Branco suplicou a João António de Freitas Fortuna que resistisse a qualquer “força ou consideração” que tentasse impugnar a sua última e fervorosa aspiração: ser sepultado no jazigo familiar deste seu amigo, no cemitério privado da Real Irmandade de Nossa Senhora da Lapa, no Porto. “Desejo ali ser sepultado”, escreveu numa carta, a 6 de abril de 1888, apelando ao amigo que “nenhuma força ou consideração o demova de me conservar as cinzas perpetuamente na sua capela”. Foi a única disposição que deixou escrita sobre a sua morte. “Dê o meu amigo a estas linhas a validade de uma cláusula testamentária e, sendo preciso, faça que ela valha em juízo”, insistia, confiando na intrepidez de Freitas Fortuna.
Exclusivo
Como Portugal tentou contrariar o último desejo de Camilo Castelo Branco
Horas depois de ser noticiada a morte de Camilo, a 1 de junho de 1890, já se reclamava um túmulo no Panteão Nacional dos Jerónimos. A reivindicação tomou forma de projeto de lei na Monarquia e na República e recrutou admiradores, escritores e publicistas. Espantosamente, os debates decorreram sempre sem atender à vontade do próprio, fixada em cartas, num auto de doação e num testamento