Livros: “As Aventuras de Huckleberry Finn” agora são as de James (e valeram um Pulitzer de Ficção)
Invertendo a perspetiva de um romance clássico de Mark Twain, Percival Everett assina um livro poderoso sobre a experiência da escravatura e a importância da linguagem enquanto subversão da ordem estabelecida
Huckleberry Finn (Eddie Hodges) e Jim (Archie Moore, antigo campeão de pugilismo) protagonizam o filme “As Aventuras de Huckleberry Finn”, realizado em 1960 por Michael Curtiz a partir da obra de Mark Twain, que é também o ponto de partida de Percival Everett para “James”, vencedor de um Pulitzer
Publicado em 1884, o romance “As Aventuras de Huckleberry Finn”, de Mark Twain, é um clássico da literatura norte-americana que não escapou, durante o século XX, a sucessivas vagas de problematização, em torno do modo como representa as personagens negras. Com as suas 219 ocorrências da palavra “preto” (nigger, a N-word que se tornou tabu) e de vários estereótipos raciais mais ou menos grosseiros, será que o texto tem um fundo racista? Ou, pelo contrário, reflete apenas a realidade social da época descrita (as décadas de 1830-40) e desmonta até os ditos estereótipos, ao revelar as suas falácias? Ao longo dos últimos 140 anos, as opiniões dividiram-se, mas o que nunca se questionou foi a qualidade da escrita de Twain, o seu génio literário.