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Livros: a dádiva do desapego

Em “Viagem no Proleterka”, o segundo livro de Fleur Jaeggy editado em Portugal, o essencial nunca está à superfície. Mas também não é revelado, por muito que escavemos

Aos 84 anos, com uma obra breve e uma vida de quase reclusão, Fleur Jaeggy, autora suíça que escreve em italiano, tem vindo a ganhar um estatuto de romancista de culto
Leonardo Cendamo/Getty Images

Num dos muitos fragmentos que compõem o labirinto narrativo brilhante, mas gélido, que é “Viagem no Proleterka”, Fleur Jaeggy descreve o anoitecer assim: “Um escuro transparente, depois opaco. Depois, quase nada.” A prosa desta discretíssima escritora suíça, autora de romances austeros, elípticos e fugidios, segue os mesmos passos dessa lapidar chegada da noite. Começa por parecer de uma nitidez cristalina, logo turvada por sucessivos indícios ambíguos, para finalmente se esbater numa espécie de indeterminação que faz ruir tudo o que parecia sólido, isto quando não deixa as personagens, e a própria história, a pairar no vazio.