Há luz verde, na maior parte dos casos, dos partidos para que o Governo possa prosseguir o seu plano e dar início à reabertura da economia. Mas também há avisos e cautelas: nesta nova fase, é preciso respeitar a Constituição e assegurar que quem tinha apoios graças ao estado de exceção que se vivia não os irá perder do dia para a noite.
O cocktail de apoios, críticas e avisos foi sendo distribuído ao longo do dia, à medida que os partidos saíam das sucessivas reuniões em São Bento para ouvirem e serem ouvidos pelo Governo quanto a esta nova etapa. Uma etapa em que a pressão económica começa a ganhar terreno - a prioridade passou a ser reanimar a economia, embora sem descontrolar a pandemia, insiste o primeiro-ministro - e que implicará a passagem do país de estado de emergência para estado de calamidade.
Os encontros foram longos: a agenda do primeiro-ministro previa que o PSD, primeiro partido a ser recebido, entrasse na reunião às 14h30 e o PS, a fechar o dia, começasse pelas 20h15. Mas o encontro com Rui Rio demorou-se logo duas horas, o dobro do tempo previsto, e toda a agenda foi escorregando: todos os partidos queriam ouvir o Governo mas também deixar os seus reparos e reivindicações.
No caso de Rui Rio, que até acabou por avançar vários dos pormenores quanto ao calendário que o Governo está a preparar, houve um claro aval - "esta é a estratégia que entendo que efetivamente deve ser levada a cabo" - e alguns avisos: as melhorias quanto à evolução do surto não são "fantásticas" e a reabertura deve ser feita de forma "prudente e lenta".
O líder do PSD contou aos jornalistas que perguntou ao primeiro-ministro se o respeito pela Constituição estará acautelado nesta fase, em que terão de continuar a haver restrições à circulação, e que obteve resposta positiva. Outras duas preocupações: a demora dos apoios financeiros para as empresas, devido à excessiva burocracia; e a demora do Estado em pagar dívidas aos fornecedores.
Do lado do Bloco de Esquerda também não há entraves ao plano do Governo, mas há um aviso claro. Numa altura em que se sabe que o índice de contágio por cada pessoa infetada aumentou, e que os especialistas alertam para uma possível precipitação na reabertura da economia, Catarina Martins pediu que os critérios de saúde pública continuassem a impor-se aos políticos e que, assim, fosse feita uma avaliação regular do impacto das medidas que forem sendo levantadas.
Os bloquistas levaram uma prioridade clara para esta fase à conversa com Costa: a necessidade de garantir que com o fim do estado de emergência não desaparecem os apoios extraordinários que foram sendo aprovados, a nível social, para fazer face aos efeitos da pandemia, como as moratórias para as rendas ou os cortes de água ou luz.
Já o CDS vem há muito insistindo em que é preciso salvaguardar a situação da economia, que está, essa sim, em verdadeiro "estado de calamidade", disse Francisco Rodrigues dos Santos em São Bento, já a noite ia avançada. De novo, com avisos: as medidas devem ser levantadas com base em "passos seguros"; e a situação económica não pode levar a aumentos de impostos, cortes nas pensões ou às nacionalizações que a esquerda pede com cada vez maior insistência.
PCP contra estado de calamidade
Os comunistas destoaram: apesar de concordarem com o plano para o desconfinamento, não apoiam a passagem à situação de estado de calamidade por entenderem que a lei já dá ao Governo margem de manobra para adotar as medidas que forem necessárias. À saída da reunião, Jerónimo de Sousa insistiu na necessidade de garantir apoios aos pequenos empresários e condições para o regresso ao trabalho, incluindo de higiene, mas recusou dar novidades de calendário sobre questões caras ao PCP, como a do acesso às creches. Por uma questão de "ética" e respeito "institucional", o líder comunista preferiu deixar anúncios para o Governo. Nesta "caminhada longa" e "progressiva" que nos espera, avisou José Luís Ferreira, do PEV, será preciso "evitar critérios economicistas" no que toca ao levantamento das restrições para escolas ou creches e transportes.
O PAN também não saiu satisfeito da reunião. O partido tem sido uma das vozes mais cautelosas, lembrando frequentemente que o indicador de contágio até aumentou nos últimos dias e que o panorama não é muito mais favorável do que era há quinze dias, sendo o potencial de transmissibilidade da doença igual. "Se é para se manterem uma série de restrições, com algumas medidas de alívio e de reativação progressiva da atividade económica, então seria mais sensato conservar o estado de emergência e fazer esses levantamentos [de condicionalismos] de forma gradual", argumentou André Silva, citado pela Lusa.
O partido vê no estado de emergência, que acaba no final desta semana, três vantagens: "não causa incertezas jurídicas", "dá muito maior robustez e garantias de certeza ao Governo para tomar medidas" e "não causa eventuais sensações de relaxamento junto das pessoas".
Chega: estado de calamidade é "confuso"
A posição do Chega é mista: o partido concorda com a ideia de se começarem a levantar as restrições, mas queria que o primeiro ciclo reabrisse ao mesmo tempo que as creches (18 de maio) e que restaurantes e cafés reabrissem a partir de segunda-feira. Por outro lado, André Ventura disse temer que o novo quadro jurídico associado à "calamidade" seja "confuso" e provoque "problemas de constitucionalidade".
Já o Iniciativa Liberal foi a São Bento concordar com o plano de reabertura da economia mas frisar que este peca por "tardio", além de dever ser mais "ambicioso" e acompanhado pelo plano de testes - tanto virológicos como serológicos - que os liberais têm vindo a defender ser essencial para uma abertura da economia.