Política

Gaspar Castelo Branco foi assassinado pelas FP 25 abril. Cavaco condecorou-o 30 anos depois

O Presidente da República Cavaco Silva condecorou esta segunda-feira a título póstumo o antigo diretor-geral dos Serviços Prisionais, assassinado pelas FP 25 de Abril, à porta de casa, no dia 15 de fevereiro de 1986. As FP estão na origem de 17 mortes, dezenas de atentados... alguns por engano

Gaspar Castelo Branco era diretor-geral dos Serviços Prisionais e foi assassinado pelas FP 25 de Abril, à porta de sua casa, na véspera da segunda volta das presidenciais de 1986
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Gaspar de Queiroz de Abreu Castelo Branco foi assassinado à porta de casa por um comando das FP 25 de Abril no dia 15 de fevereiro de 1986. Trinta anos depois, e a pouco mais de três semanas de deixar o Palácio de Belém, o Presidente da República Aníbal Cavaco Silva assinalou o 30º aniversário deste sábado trágico para a família do antigo diretor dos Serviços Prisionais, condecorando-o a título póstumo: “As insígnias da Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique” foram entregues à “viúva do homenageado, Maria Isabel Castelo Branco”, lê-se numa nota divulgada no site da Presidência.

Para a família, a condecoração do PR é um gesto “importante”, disse ao Expresso, Manuel Castelo Branco, um dos três filhos de Gaspar, que tinha 17 anos quando lhe mataram o pai à porta de casa: “É difícil falar hoje do que aconteceu há 30 anos. O meu pai foi o mais alto funcionário do Estado a ser vítima das FP-25 de Abril... a morte dele gerou medo nos [titulares] de órgãos de soberania. Foi depois do meu pai ser morto que Cavaco Silva passou a morar na residência oficial do primeiro-ministro”.

Três meses antes, Cavaco, tomava posse como primeiro-ministro, na sequência da dissolução do chamado Governo do Bloco Central (IX Governo), chefiado por Mário Soares; estava em marcha o ciclo do ‘cavaquismo’ que haveria de se prolongar por três Governos, até outubro de 1995.

A partir daí, “a sensação de que Portugal era um país de brandos costumes desapareceu”, diz Manuel ao Expresso: “As instituições do Estado estavam enfraquecidas, e o país não soube reagir (...) cerca de um mês depois houve um atentado da ETA em Espanha” e a forma como as autoridades reagiram “foi totalmente diferente”.

Dois atentados em 4 dias... um deles por engano

Não fosse este atentado terrorista das FP 25 de Abril e esse sábado teria sido um pacato dia de reflexão eleitoral para todos os portugueses; o país ia a votos no domingo, 16, para eleger um novo Presidente da República, num sufrágio renhido entre os dois candidatos que tinham passado da primeira para a segunda volta da corrida presidencial: Diogo Freitas do Amaral e Mário Soares, que viria a ser eleito para o seu primeiro mandato como PR.

Nos dias que precederam e sucederam a segunda volta das eleições presidenciais de 1986, as FP 25 de Abril estiveram particularmente ativas; primeiro assassinaram com dois tiros disparados por uma “arma de nove milímetros” (de acordo com o relatório da autópsia) Gaspar Castelo Branco. Três dias depois, na terça-feira, 18, as FP foram responsáveis pela explosão de uma bomba, que deflagrou no interior de um automóvel que estava parado junto à embaixada dos EUA na capital portuguesa.

Entretanto, no funeral de Gaspar Castelo Branco, o Estado só se fez representar pelo ministro da Justiça, Mário Raposo; nem o primeiro-ministro, nem os PR's cessante ou eleito, estiveram presentes. A condecoração entregue esta segunda-feira, foi “a primeira” e única distinção do “Estado português para com a memória do meu pai”, lembra o filho.

Num texto publicado (hoje) no blogue “31 da Armada, Manuel diz que o pai “não foi assassinado por se opôr ou discordar das FP-25 Abril, mas porque no exercício da sua função, ao serviço do Estado, cumpriu o seu dever, acatou ordens com coragem, determinação e sentido de dever e assumiu responsabilidades quando outros delas se demitiram. Era o homem certo no lugar errado e por isso foi morto”.

Na sua edição de 22 de fevereiro (ver PDF) o Expresso escrevia que a bomba que explodiu na embaixada dos EUA “estaria destinada a rebentar noutro local - e só explodiu no edifício consular por mero acaso. O engenho, constituído por uma carga de explosivo de plástico acionado por um mecanismo de relógio, teria sido colocado no automóvel de um ‘funcionário da segurança’ da Embaixada durante a permanência deste num hotel da capital, programada para rebentar cerca de uma hora depois”.

O funcionário da embaixada parou num centro comercial depois de ter deixado o referido hotel, indo depois à embaixada; este regresso à embaixada para recolher os óculos que deixara esquecidos, acabaria por lhe salvar a vida: o carro foi revistado pelos serviços de segurança que detectaram o engenho explosivo, e a detonação acabaria por ser provocada pela brigada de minas e armadilhas da PSP.

De acordo com essa edição do Expresso, num texto assinado por Celestino Amaral, os serviços da embaixada dos EUA recusaram-se “sistematicamente, a revelarem a identidade do condutor”; esta circunstância, levou “alguns observadores a supor tratar-se de um agente da central norte-americana de informações, CIA - que normalmente exercem a sua atividade sob a designação de funcionários de segurança”.

Na década de 1980 [entre 1980 e 1987], as FP 25 de Abril, uma organização armada que atuava à margem do quadro legal do sistema democrático, foram responsáveis por 17 mortes em Portugal, que resultaram de vários ataques a tiro e atentados com recurso a explosivos. No texto publicado no “31 da Armada”, no dia em que o pai foi homenageado, Manuel Castelo Branco, escreve: “ As FP 25 de Abril foram responsáveis por 17 atentados mortais, entre os quais um bebé de dois anos (apelidado pela organização como um erro técnico). A última vitima foi o Álvaro Militão agente da Direcção Geral de Combate ao Banditismo. [Por isso] não foi só aos mortos que o País não mostrou a sua gratidão: agentes da Judiciária, da Direcção Geral de Combate ao Banditismo, juízes como Martinho de Almeida Cruz, Adelino Salvado e procuradores como Cândida Almeida, entre outros”.