Sim, um velho; um velho da espécie homo sapiens, bem entendido; um velho humano e não canino. É que está a ficar irrespirável, lamento: a sociedade hipersensibilizada em relação ao bem-estar animal, a sociedade que rasga as vestes quando se descobre um canil clandestino e que equipara logo o cangalho ao Biafra ou Sudão, como se cães escanzelados fossem iguais a humanos raquíticos, a sociedade que ameaça com um motim quando há uma caçada mais embrutecida, a sociedade onde casalinhos burgueses passeiam nas ruas os seus “meninos”, que afinal são cães, e que depois dizem que não têm tempo para ter filhos (filhos humanos), a sociedade que (não vale rir) já tem creches para cães, que ficam muito ansiosos com a ausência dos donos durante o dia e que por isso precisam de infantário (não estou a gozar), a sociedade cheia de senhoras que vestem os cães como se fossem crianças, a sociedade carregada de pessoas que andam com os cães ao colo como bebés, a sociedade que resolve passear gatos de trela (não vale rir de novo), a sociedade que exige um IRS canino e até um SNS para a bicheza, apre!, é a mesmíssima sociedade que depois abandona velhos todos os dias nas ruas e até nos hospitais. Neste momento, 12% das camas dos hospitais estão ocupadas por velhos sem problemas de saúde, velhos que têm de ficar ali porque não têm para onde ir. Estamos a falar de 2342 pessoas abandonadas nos hospitais. Daqui a seis meses serão outros 2300. O número é inacreditável, tal como é inacreditável o silêncio coletivo sobre o assunto.
Exclusivo
Não podem adotar um velho em vez de um cão?
Velhos abandonados nos hospitais são uma forma de violência