1) I don't care about the presents
Uma das músicas de Natal que mais dificilmente nos sai dos ouvidos celebra este ano o seu 30.º aniversário. Há três décadas que a ouvimos, dentro e fora de centros comerciais, e cantamos não querer saber dos presentes debaixo da árvore de Natal, nem de pendurar meias à lareira… trauteamos que o Pai Natal não nos vai fazer feliz com um brinquedo na manhã de Natal, gritamos que só queremos uma coisa, mais do que alguma vez será possível saber e pedimos que o nosso desejo se torne realidade: “tudo o que eu quero para o Natal és tu!”.
Trinta anos depois, penso num slogan que já vi em sweatshirts humorísticas, especialmente antes da campanha do Brexit, com a frase All I Want for Christmas Is EU, mas, mais do que isso, penso em Ursula von der Leyen que, na semana passada, conseguiu aquilo que só era possível nos tempos da música original: uma Comissão Europeia aprovada “à primeira” (todos os comissários propostos foram aprovados pelo Parlamento Europeu), o que não acontecia desde 1999. Houve sempre chumbos, desde então.
No fim de semana, numa festa já em tons natalícios, a reeleita presidente da Comissão Europeia (também foram poucos os presidentes reeleitos na história da Comissão), despediu-se animada de alguns dos seus companheiros – alguns que lhe dificultaram o mandato anterior –, e prepara-se para começar um novo mandato com força reforçada, ancorada em poderes diplomáticos que não lhe eram conhecidos antes. Enquanto Donald Trump formava a sua nova equipa além-Atlântico, podia dizer-se que Ursula não se preocupava com os “presentes” que recebeu ou de que se despedia, para formar a sua nova Administração para governar a União Europeia até aos novos anos trinta.
Depois de, em junho de 2024, o Parlamento Europeu ter ficado tão ou mais fragmentado do que os parlamentos alemães, franceses, espanhóis ou o nosso português, Von der Leyen soube equilibrar forças e desenhar um mapa com os nomes que lhe foram apresentados por cada Estado-Membro que revelou mestria e saber, qual treinadora perspicaz de uma equipa de futebol cheia de egos difíceis de gerir.
2) I don't want a lot for Xmas (or 2025)
Em tempos em que se repete que os moderados estão condenados ou enfraquecidos, a vice-presidente do partido de centro-direita alemão que deverá voltar ao poder depois das eleições convocadas para 2025, soube relacionar-se com a Itália de Meloni e dar-lhe peso no seu novo governo, e tem tentado navegar entre as fraquezas de Scholz, Macron ou Sánchez e as tentativas de reforço de Tusk na Polónia e poderá fazer uma equipa invulgar com Kaja Kallas, a nova Representante da União Europeia para a Política a Externa e de Segurança Comum, que irá substituir o desgastado espanhol Josep Borrell. Também António Costa entra a tentar ser um “anti-Michel” como presidente do Conselho Europeu.
Kallas, a quem a RTL chamou “a pessoa certa” ou o “falcão russo” também é uma ex-primeira-ministra e será a primeira “liberal” a ocupar um cargo que, recentemente, foi confiado a políticos de esquerda (antes de Borrell, tinha ocupado o cargo outro espanhol, Javier Solana, seguido da inglesa Baronesa Ashton e da italiana Federica Mogherini). Nenhum foi definidor ou marcante na política externa europeia, que em tudo destoa do “Hino da Alegria” que a comunidade canta nos seus momentos de união e canta sempre de forma desafinada, em diferentes vozes e tons, e não tem tido a força necessária, perante a Rússia, a China ou os Estados Unidos da América, ou outros rivais ou parceiros comerciais.
O novo ano começa com baixas expetativas (e isso normalmente é bom, em qualquer domínio) e, se forem habilidosos, a nova Presidente da Comissão e os seus aliados poderão jogar com isso.
Por outro lado, também em Portugal temos de baixar as expetativas. Daqui a um ano vamos estar em plena campanha presidencial (aí sim, a pensar no All I want for 2026), mas, até lá, como os ingleses, teremos eleições locais e ainda não conhecemos os principais nomes para capitais de distrito, de Lisboa ao Porto, que serão renhidas e determinantes para ver o impulso com que cada partido português partirá para o ano seguinte. Era bom começar a jogar essas cartas e a ter alguma ambição, mas…
Para 2025 devemos querer mais paz, ou a paz possível, o atenuar dos conflitos existentes, devemos querer prosperidade, ou a riqueza possível, dentro da regulação necessária para que os mercados funcionem e o modelo social europeu continue a funcionar e devemos querer inovação, dentro dos limites e da ética que tantas vezes se esquecem nestes domínios.
3) All I want for Xmas is EU
A música de 1994 sobre o Natal continuava com desejos de neve, que inevitavelmente nos levam a pensar nos desejos de que as políticas climáticas da UE se alastrem pelo mundo e não deixem as futuras gerações à espera debaixo do azevinho, a fazer listas de desejos e a mandá-las para o Pólo Norte para o velho São Nicolau, a tentar ficar acordado para ouvir renas mágicas.
Nestas noites de dezembro e do advento que começa podemos mesmo cantar uma música apaixonada à União Europeia (se não é em Portugal, aonde é que o vão fazer) e dizer que queremos abraçar a UE com tanta força (não apenas ao PRR, e aos fundos europeus, mas à boa ideia de “Europa das Nações”).
Precisamos de uma França que, qual Notre Dame, renasça das cinzas para enfrentar os anos que aí vêm, de uma Alemanha que volte a ter motores a funcionar, para pôr esta Europa a acelerar, precisamos de uma Itália que pensa e inova, de uma Espanha que ultrapassa feridas, de uma Polónia que assume o seu peso e lugar de destaque, precisamos de um Reino Unido que saiba pacificar-se consigo próprio e com a Europa para a próxima década, até que haja oportunidade de um novo referendo (era tão bom que aceitassem a proposta de um programa de circulação de estudantes, que lhes faria bem a eles e a nós), precisamos da Estónia e dos países de Leste a continuarem a inovar mais do que sabemos e precisamos de saber, também nós, em Portugal, ser úteis, não apenas a conseguir lugares-chave. Há pontes que podemos construir, há chaves que ainda estão nas nossas mãos, e seria bom contarmos com a Presidente “Yoursula” e cantarmos All We Want for Xmas is EU.