Na semana passada tive o privilégio de participar em mais uma sessão do Parlamento dos Jovens, uma iniciativa da Assembleia da República dirigida aos jovens dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e do ensino secundário. Este programa explora um tema diferente todos os anos, como a construção da cidadania europeia, a preservação do ambiente ou a igualdade de género e, este ano, no quadro de celebração dos 50 anos do 25 de Abril, os caminhos para uma escola plural e participativa.
A iniciativa tem o propósito de capacitar os jovens para o debate plural e o exercício dos mecanismos da democracia, em particular a discussão de ideias com elevação e respeito pela diversidade de opiniões, assim como a compreensão dos mecanismos de representação e de eleição que caracterizam o nosso sistema democrático. Em última análise, pretende-se educar para a cidadania, estimulando o gosto pela participação cívica e política, sublinhando a importância da contribuição dos jovens para a resolução de questões que afetem o presente e o futuro individual e coletivo, apresentando as suas propostas aos órgãos do poder político, tornando claro que a política é uma missão nobre bem distinta de estilos e argumentários importados de outros universos.
Para cumprir estes objetivos, depois dos debates realizados nas escolas e ao nível distrital, com eleição de representantes, é realizada a Sessão Nacional do Parlamento dos Jovens, com a participação dos deputados jovens, a nível nacional, representando cada distrito ou região autónoma, na qual se aprova, após debate em Comissões e em Plenário, a Recomendação final sobre o tema de cada edição da iniciativa.
Realizando-se anualmente, na Assembleia da República, desde 1995, estas Sessões ajudam os jovens a compreender a importância dos mecanismos da democracia, na conceção procedimental de, por exemplo, Norberto Bobbio, quando defendeu que as regras que definem quem deve decidir e como, que caracterizam a democracia, permitem a livre a pacífica convivência dos indivíduos na sociedade.
Por outro lado, abordando temas que os jovens facilmente identificam como problemas a resolver, a iniciativa também ajuda a compreender que a democracia não se restringe aos processos eleitorais, que a conceção procedimental tem de ser conciliada com uma conceção ética da democracia, ou seja, com a capacidade de identificar e discutir os valores em que deve assentar a sociedade que queremos e que justificam as decisões que devemos tomar para resolver os problemas sociais. É, assim, uma iniciativa que, verdadeiramente, contribui para capacitar os jovens e futuros eleitores para o exercício da democracia, porque esta não é, nas palavras de Beatrice Webb, uma mera “multiplicação de opiniões ignorantes”.
Esta iniciativa dá-nos ainda o mote para refletir sobre o caminho para combater os sinais de crise da democracia contemporânea, como as elevadas taxas de abstenção nos atos eleitorais e a falta de qualidade do debate político que pode enviesar o processo através do qual os cidadãos formam as suas decisões, incluindo sobre o sentido de voto. Este só pode ser o caminho de uma cidadania mais ativa e um espaço público com protagonistas capazes e melhor qualidade de informação.
É fundamental debater as decisões políticas, de forma plural, com profundidade, com base em evidências e consciência dos impactos sistémicos que estas efetivamente têm na sociedade e não só nas dimensões mais óbvias. Cidadãos e partidos políticos, os protagonistas da democracia, têm de estar cientes que não basta cumprir os mecanismos formais da democracia e garantir que estes não são destruídos por alguma forma de autoritarismo ou corrompidos pelo populismo. É também necessário que as instituições tenham qualidade e credibilidade, porque a democracia assenta no estabelecimento de relações de confiança entre os cidadãos e os seus representantes. E essa confiança passa por ligar processos e resultados: exige-se aos atores políticos que falem verdade, tenham capacidade de resolver problemas com competência e que o demonstrem num processo permanente e cabal de prestação de contas.
E mais: que o façam envolvendo os cidadãos, debatendo as melhores soluções, com clareza, sem sectarismo nem gritaria que só desvia a atenção para o acessório e degrada a imagem da política. Não transformar a arena política democrática no circo máximo é uma responsabilidade de todos. E, se necessário for, algo que todos têm de estar disponíveis para (re)aprender para termos uma democracia liberal melhor e com futuro. É imperativo que cada ato eleitoral seja uma renovação da esperança nesta que é uma das pedras angulares da nossa sociedade. A alternativa seria inimaginável.