Partilhar uma opinião sobre o mundo é um exercício de responsabilidade. Pelo menos é assim que o encaro. Ao longo deste ano, tive ocasião de refletir sobre vários temas relacionados com a nossa vida em sociedade, os serviços públicos que sustentam o Estado social e, por diversas vezes, sobre a democracia e aquilo que estamos a fazer dela. Este tem sido talvez o tema mais recorrente. E, olhando em frente, penso que tem de continuar a merecer toda a nossa atenção. Conflitos armados sem fim à vista, populismos de vários quadrantes, a velocidade de utilização da inteligência artificial sem ainda grande regulação ou discussão informada acerca da sua utilização, as alterações climáticas que parecem irreversíveis ou a competição pelas energias verdes que altera o mapa mundial de recursos energéticos, geram uma enorme incerteza económica e um turbilhão de mudanças sociais às quais os governos procuram dar resposta e que colocam pressão sobre os regimes democráticos.
Na sua publicação anual “The World Ahead”, a revista The Economist analisa as principais tendências para 2024, destacando as eleições que ocorrerão em todo o mundo: mais de metade das pessoas no planeta vivem nos 76 países que terão eleições nacionais em 2024. É a primeira vez que este número é alcançado desde o advento do sufrágio universal. Mas este facto, que poderia ser lido como o triunfo da democracia, não é sinónimo de qualidade da mesma. É certo que podem existir motivos para celebrar, como a primeira mulher que será eleita presidente do México. Mas nos Estados Unidos da América, adivinha-se um embate que poderá ter enormes repercussões fora das suas fronteiras: o possível confronto entre dois candidatos de idade avançada, numa eleição que alguns já chamam a eleição do Armageddon: uma sondagem realizada em setembro passado revela que 65% dos eleitores norte-americanos admitem estar exaustos, 55% admitem sentir raiva, apenas 10% admitem ter momentos de esperança no futuro e só 4% se sentem entusiasmados com a política do seu país. Noutros países as mesmas perguntas teriam provavelmente as mesmas respostas assim como as palavras que mais são utilizadas para descrever a política: divisiva, corrupta, suja ou má. Neste cenário, a simples candidatura de Trump parece minar a democracia americana, ao admitir a possibilidade de eleger um candidato que tentou subverter os resultados da eleição anterior e ativamente encorajou uma insurreição pela qual ainda responde em tribunal e que utiliza uma retórica cada vez mais corrosiva para a democracia. O grande tema das eleições não será nada do habitual, como a política externa ou a economia, mas o simples facto de o candidato ter ou não condições para ocupar o cargo. É neste ponto que a democracia se encontra, com níveis elevados de exaustão e até raiva perante “o sistema” e os seus protagonistas. E é bom olharmos para este retrato fora de portas para não pensarmos que só por cá existem problemas. Aliás, basta olhar para o que se passa na Grã-Bretanha, onde existe a possibilidade de os trabalhistas vencerem após 14 anos de domínio dos conservadores, numa campanha em que o estado do National Health Service será seguramente um tema quente, com falta de ambulâncias, pessoas idosas nos corredores, enfermeiros a emigrar, listas de espera a aumentar e greves de médicos.
Também em Portugal, em março do próximo ano teremos ocasião de escolher o partido que orientará o nosso país nas águas turbulentas dos próximos tempos, resolvendo os problemas que afetam as pessoas e colocam em causa a robustez do regime e das suas instituições. O PS tem dado provas de fazer aquilo que muitos consideravam ser impossível: sair de um programa de assistência financeira elevando rendimentos e o emprego, combatendo uma pandemia cuidando das pessoas e da economia, enfrentando a inflação com medidas que protegem as famílias e as empresas. Uma vez mais, o PS está unido em torno de um projeto de futuro. Com pluralidade de visões mas colocando o futuro do país sempre em primeiro lugar, unido com a força da obra feita, das convicções e da capacidade de agir. Porque essa é a missão de um partido político democrático: servir o país. Uma evidência a não esquecer num ano em que se assinalarão os 50 anos do 25 de Abril de 1974. Já não somos esse país periférico e relativamente pobre que à data, intrigou a comunidade internacional. Os grandes números da Economist refletem uma realidade diferente: o crescimento do PIB em Portugal situa-se nos 1,6% (acima do 1% da Suécia ou dos 1,1% da Bélgica, países de dimensão populacional equivalente) e a inflação nos 2,8% (abaixo dos 4% da Suécia e perto dos 2,4% da Bélgica). Mas a verdade é que não somos imunes “à emergência de partidos e movimentos populistas, aos índices decrescentes de participação política dos cidadãos, à erosão dos princípios e valores democráticos na comunidade, assim como à clausura das elites políticas e à ausência de diálogo entre partidos e sociedade civil”, só para citar algumas das ameaças que impendem sobre a generalidade das democracias liberais contemporâneas, como se refere no prefácio da obra “O essencial da política portuguesa”.
Em fevereiro, tem início o ano do dragão no calendário chinês, um ano que promete mudanças positivas, crescimento, abundância, energia, sucesso e prosperidade. Que esta seja também uma oportunidade para lançar uma nova vaga de democratização que renove a esperança dos cidadãos num futuro melhor.