Nas últimas três semanas, um coro de adversários e comentadores - condições em alguns casos coincidentes - têm proclamado em uníssono a necessidade imperiosa de a Iniciativa Liberal integrar uma coligação pré-eleitoral com o PSD. Nos jornais em papel, nos digitais, nas rádios e nas televisões não passa um dia sem lermos ou ouvirmos estes apelos, quase ultimatos. E quase ameaças, pois há até quem se apresse a responsabilizar a Iniciativa Liberal por um eventual insucesso eleitoral do PSD nas legislativas de 10 de Março.
Agarram-se à aritmética ignorando a política. E nem lhes ocorre um cenário que conjugaria ambas. São puramente coligacionistas.
Gostava de saber onde andavam alguns destes comentadores quando, em Janeiro deste ano, a Iniciativa Liberal apresentou uma moção de censura ao Governo de maioria absoluta. Perante um Governo incapaz, incompetente e instável, que juntava a degradação das instituições à degradação económica e à dos serviços públicos, nessa altura o PSD refugiou-se numa cómoda abstenção, sem acompanhar a IL.
Onde andavam esses tais analistas quando os deputados liberais apresentaram o projeto de lei SUA Saúde, visando uma verdadeira reforma neste sector, que vive mergulhado na maior crise desde que foi criado? Esta proposta previa a integração dos sistemas público, privado e social, dando liberdade de escolha aos cidadãos, como solução viável para o problema vivido por utentes e profissionais, agravado a níveis impensáveis pela desgovernação socialista. O PSD, preferiu votar contra invocando argumentos de quem não leu ou não percebeu a proposta.
Hoje não resta a menor dúvida: a razão estava do nosso lado. Na moção de censura, nas alternativas para devolver a Saúde aos portugueses. Nós, liberais, fizemos oposição a António Costa sem tacticismos ou calculismos. E apresentando sempre em alternativa propostas reformistas e corajosas. Por algum motivo o provável sucessor de António Costa no Largo do Rato aproveita cada ocasião para chamar “radicais” aos liberais. É um elogio que exibimos com orgulho na lapela.
Vale a pena lembrar mais casos. Enquanto a Iniciativa Liberal avançava com um pedido de inquérito parlamentar à TAP, o PSD preferia firmar um pacto de cooperação com o Governo sobre a localização do futuro aeroporto de Lisboa. Projeto que António Costa foi empurrando com a barriga ao longo de oito anos, bem à sua maneira. O tal pacto de nada adiantou. Serviu apenas para neutralizar as críticas dos sociais-democratas à inação socialista.
Foi também a Iniciativa Liberal quem se opôs sem qualquer ambiguidade ao ataque à propriedade privada contido no chamado Programa Mais Habitação. Com medidas ainda mais lesivas para um sector mergulhado em grave crise, a tal ponto que o Presidente da República acabaria por vetar o diploma, usando palavras muito duras: “Não é fácil ver de onde virá a prometida oferta de casa para habitação com eficácia e rapidez.” Sem hesitar um segundo, saímos em defesa dos milhões de portugueses que são proprietários da casa onde habitam ou que adaptaram para alojamento local, dinamizando cidades, vilas e aldeias.
O mesmo aconteceu no combate desde a primeira hora à anunciada intenção do Governo de agravar o Imposto Único de Circulação (IUC), lesando os mais pobres e as franjas mais frágeis da própria classe média, sem rendimentos que lhes permitam adquirir novos automóveis ou motociclos. Num país já submetido à maior carga fiscal de sempre, era outra maneira de a maioria socialista ir ao bolso dos contribuintes utilizando o pretexto hipócrita da defesa do ambiente. Ficou, também aí, bem expresso o nosso protesto. E, também aí, a Iniciativa Liberal foi bem-sucedida. O PS, trocando os pés pelas mãos, mal sentiu o cheiro a eleições, acabou por recuar.
Não ficámos a meio caminho, nesta como noutras matérias. Começando pela exigência da redução generalizada dos impostos, desde logo o IRS, aquele que mais penaliza quem trabalha e quem cria riqueza. Sempre com ambição e não numa visão “poucochinha” disputada por PS e PSD.
Ainda recentemente, na última votação na especialidade do Orçamento do Estado, perante uma proposta da Iniciativa Liberal para extinguir impostos e taxas anacrónicos, como o “imposto da ponte”, que existe desde 1966, lá esteve a bancada liberal sozinha.
Os portugueses não têm dúvidas de que esta legislatura prestes a terminar a meio, teria sido muito diferente sem os deputados que integram o grupo parlamentar da Iniciativa Liberal. Não abdicamos do nosso ideário. Nunca negociamos princípios em troca de lugares. E temos a convicção forte de que um dos problemas estruturais de Portugal é haver socialismo a mais e liberalismo a menos. Trata-se de um combate que ninguém fará por nós. Seremos nós a travá-lo, tal como temos feito.
Conhece-nos mal quem imaginou que afrouxaríamos esta luta para nos servirmos de outra sigla partidária como barriga de aluguer. Sobretudo por troca de lugares.
Todas as comparações históricas que vão sendo feitas com a Aliança Democrática em 1979 e 1980 são descabidas por corresponderem a uma realidade muito distante da actual. Basta lembrar que nesses anos havia ainda o Conselho da Revolução, a banca comercial estava interdita ao sector privado e as chamadas “nacionalizações” de 1975 eram consideradas irreversíveis no próprio texto constitucional. O país é outro, muito diferente. Os problemas que urge resolver também.
O grande mérito das decisões desse período foi a coragem que demonstraram. A mesma coragem com que a Iniciativa Liberal tem trilhado o seu caminho.
Subsiste o problema da lei eleitoral. A atual lei inutiliza, na conversão de votos em mandatos, as opções e escolhas partidárias de centenas de milhares de portugueses. Não nos culpem por isso. Defendemos a reforma com a introdução de círculo uninominais e um círculo nacional de compensação. Reforma que os dois partidos mais representados no parlamento, PS e PSD, foram sempre adiando, legislatura após legislatura, para manterem um sistema que há muito deixou de refletir a vontade dos portugueses. Se, afinal, o problema está nos círculos uninominais, veremos o que acontece quando o nosso projeto focado no círculo nacional de compensação for a votos no hemiciclo já este Dezembro.
Convém, por fim, lembrar a esses comentadores que há diferenças substanciais entre aritmética e política. Não basta agregar para somar. Muitos votos da IL vieram de jovens eleitores que exerceram este direito cívico pela primeira vez, de gente que antes de aparecermos preferia abster-se e de eleitores descrentes em outros partidos. Nada garante que continuariam a acreditar em nós se viéssemos embrulhados com outras siglas. E têm os partidos que apelam à coligação a certeza de que os seus potenciais eleitores ficariam certos no formato coligação? Ninguém é dono do voto de ninguém. Quem busca uma alternativa deve sempre começar pelas políticas, nunca pela aritmética.
Uma Iniciativa Liberal sem voz própria nestas legislativas abdicaria do seu programa eleitoral, iria a jogo descaracterizada, descafeinada e sem o suplemento de esperança que tem trazido a centenas de milhar de portugueses. Perdia todos os debates por falta de comparência, sujeitando-se a uma irrelevância que de todo não merece. Ficaria condenada a meter o liberalismo na gaveta, imitando o que Mário Soares fez ao socialismo em 1977 quando se abraçou ao CDS para formar um dos seus governos.
Pedirem-nos isto é como pedir uma traição a membros e eleitores, aos milhares de jovens e menos jovens que têm confiado em nós. Seria algo contranatura para um partido que faz das ideias uma das suas senhas de identidade e jamais abdicará do combate em todas as frentes. Contra a esquerda mais estatista e sectária da Europa, que chama “extrema-direita” ao liberalismo enquanto pratica a extorsão fiscal aos portugueses em nome do progresso. Uma esquerda que jura “acabar com os ricos” em vez de pôr fim à pobreza.
Não iremos por aí. Aos coligacionistas de ocasião dizemos que continuaremos a multiplicar ideias para continuarmos a somar mandatos.
Alguns dos que agora insistem em ver-nos diluídos em listas eleitorais com o(s) símbolo(s) de outros partidos seriam os mesmos de dedo em riste, caso estivéssemos para aí virados, acusando-nos de renegar identidade e princípios a troco de um prato de lentilhas. Conhecemo-los bem, não tenhamos a menor dúvida de que assim fariam.
Entre a descaracterização e a convicção, escolhemos a convicção. Entre a coligação e a coragem, escolhemos a coragem.