Opinião

Estabilidade para quê?

A estabilidade não pode ser um fim em si mesmo. A estabilidade não é um elemento estruturante da democracia, onde reina a dissensão e o debate aberto. Aliás, a estabilidade costuma ser, isso sim, um valor muito caro às ditaduras

Já a minha avó costumava dizer: neto, vale mais quem quer do que quem pode. Vem esta lembrança a propósito do valor da estabilidade em política. Ser garante da estabilidade. Ter uma maioria absoluta. Afinal, para quê?

Para que tudo fique na mesma? Para que nada melhore? Para que se empurrem os problemas para baixo do tapete, tapando-os com propaganda paga pelos contribuintes?

A estabilidade não pode ser um fim em si mesmo. A estabilidade não é um elemento estruturante da democracia, onde reina a dissensão e o debate aberto. Aliás, a estabilidade costuma ser, isso sim, um valor muito caro às ditaduras.

É certo que é sempre melhor a ordem que a desordem e o caos. O equilíbrio, melhor que o total desequilíbrio. Mas o tacticismo soturno, manhoso, rasteiro, que apenas promove o deixa andar, a irresponsabilidade, só pode levar à estagnação. E o que estagna, normalmente cheira mal. E é, com muita probabilidade, o ponto a que chegámos.

Ou seja, a estabilidade, a existência de uma maioria robusta e resiliente, como agora é moda repetir, se tem algumas vantagens e pode servir de alavanca na vida de uma nação, é porque permite melhorar as condições de existência. De todos!

Para tal, essa estabilidade, a maioria absoluta e a liderança, que pretensamente a garante, deviam servir, entre outras coisas, para criar um Estado:

1. Respeitado pelos cidadãos, pela sociedade e pelas diversas comunidades. Que fortaleça o civismo e a tradicional providência. Para que os cidadãos se sintam, não apenas como utentes, mas, sobretudo, como donos do seu destino.

2. Que promova a competição saudável, que estimule a escolha. A questão central não é tanto a do serviço ser prestado pelo setor público ou privado. O ponto decisivo está em existir concorrência ou monopólio, pois o monopólio, público ou privado, tende sempre a limitar a liberdade de escolha e, consequentemente, a encarecer e degradar a qualidade dos serviços prestados.

3. Movido pela missão, que qualifique e dignifique as instituições públicas através da avaliação de indicadores de desempenho e que evidenciam, consequentemente, a melhoria do serviço prestado. Só assim poderá ser objeto de escrutínio e objetivamente responsável.

4. Orientado para os resultados e não apenas para procedimentos complexos e burocráticos. Que lidere pelo exemplo, e tenha sempre como finalidade o interesse público.

5. Rigoroso na gestão dos recursos disponíveis, porque estes são sempre escassos. A avaliação custo-benefício e a análise do custo de oportunidade devem estar sempre presentes em cada utilização dos recursos públicos.

6. Desconcentrado, onde o princípio da subsidiariedade esteja sempre presente, que transite da clássica hierarquia, da Torre para a Praça, para usar o título do último livro de Nial Ferguson. No fundo, passar da decisão em pirâmide para a contratualização e o trabalho em rede.

7. Que reduza os impostos sobre o trabalho e sobre a criação de riqueza. Orientado para o mercado. Que reduza os custos de contexto e que regule com firmeza as falhas desse mesmo mercado.

8. Preventivo, que antecipe os riscos e os perigos. Que não corra atrás do prejuízo, tentando remediar as ocorrências, mas que antecipe, avalie e dê confiança aos cidadãos. Afinal, vivemos, cada vez mais, numa sociedade complexa e de risco.

Em suma, mais do que um Estado grande, importa garantir um Estado que seja forte, que funcione, seja imparcial e justo. Afinal, um Estado com qualidade, pois só instituições fortes e credíveis geram a riqueza das nações. Um Estado que defenda a liberdade, mas que assegure a igualdade de oportunidade para todos.

Terminando como comecei, ou seja, recordando as sábias palavras do povo, repetidas pela minha saudosa avó - se, após todos estes anos, a pretensa e autoproclamada estabilidade, assente numa maioria robusta e resiliente, não conseguiu fazer nada disto, podendo, e tendo as condições ideais para o fazer, então é porque não sabe ou não quer. E, infelizmente, ambas as alternativas são igualmente más para o futuro de todos nós.