Opinião

Um filósofo, um informático e um biólogo entram num departamento de IT...

A chegada abrupta, embora anunciada, da Era Digital, representa um enorme desafio para as lideranças atuais. Há várias razões para que tal aconteça, desde a forma como a organização foi projetada para um mundo diferente daquele em que vivemos, onde as decisões usufruíam do tempo necessário para nos sentirmos confortáveis para a mudança que podem implicar, até ao simples mas inescapável facto que num mundo digital o seu departamento de IT representa um investimento e nunca um custo. Algo que maior parte das empresas ainda está a demorar a interiorizar.

Estou a imaginar a reação do leitor a pensar “e é preciso escrever isto?”. É.

O panorama empresarial português está repleto de organizações de média e grande dimensão que pensam o departamento de IT fora do processo de criação de valor para o cliente, onde as lideranças se mantêm à parte do processo de transformação tecnológica a que a realidade nos mergulhou. E isto simplesmente não pode continuar a acontecer.

A ideia que proponho para reflexão é a seguinte: o IT deve ser o motor de inovação da empresa, um verdadeiro “business enabler”, e como tal a absoluta prioridade dos decisores. Sem IT não há verdadeira inovação num mundo digital, as ideias não fluem e não dão origem a respostas inovadoras.

Alguns líderes parecem avessos a mergulhar nesta necessidade porque imaginam o departamento de IT repleto de engenheiros informáticos, provavelmente fechados numa gaiola própria para tais seres, incapazes de comunicar sem ser em código com os restantes mortais. Nada deve estar mais longe da verdade. Se a cápsula endoscópica foi inventada por Gavriel Iddan, um designer de armamento depois de estar à conversa com um gastroenterologista, o próximo produto que levará a sua empresa a ser um sucesso pode muito bem nascer de um diálogo entre um engenheiro informático e um antropologista que trabalham na mesma organização.

A inovação é o resultado de uma conversa permanente entre diferentes formas de pensar, formações e capazes de pensar na vantagem da reciprocidade sobre o egoísmo de departamentos fechados sobre si próprios. Não existe espaço para “quintas” num mundo que, quer queira ou não queira, foi forçado a estar em permanente comunicação, onde o diálogo entre todos gera respostas originais para problemas que ainda há pouco pareciam insolúveis.

Qual deve ser o papel das lideranças? Acordar as suas organizações e integrar-se nessa transformação. Quando? Hoje. Como? Criando uma organização que é mais capaz de mudar as prioridades dos negócios, capaz de aumentar a velocidade de entrega e melhorar a qualidade do seu produto e sobretudo integrando efetivamente a fase da descoberta ou invenção de produtos e a entrega de produtos.

Nenhum líder se pode autoexcluir deste processo seja qual for a razão, este é “o” processo. Para reformular uma organização que fomente um alinhamento com os objetivos estratégicos cabe à liderança dar os passos necessários para deixar para trás uma matriz empresarial que já estava desatualizada à 10 anos e que hoje é um entrave ao seu crescimento e à capacidade de desenhar organizações baseadas em cadeias de valor para garantir qualidade de entrega máxima para os clientes.

Estas são algumas das consequências mais ignoradas da pandemia e da aceleração da transformação digital. A liderança tem de pensar a sua organização de forma totalmente diferente. Tem de estar ativamente presente nessa mudança. Tem de olhar o departamento de IT como o motor da sua organização. Tem de apostar em diferentes formações académicas e profissionais para operacionalizar essa transformação.

Esta é a Era da Transformação não apenas digital mas a Era dos Líderes.

* Luís Gonçalves é presidente executivo da consultora de gestão Evollution 4 All