Longevidade

“Têm um papel ativo na sociedade”: na Amadora, seniores são agentes que se dedicam à segurança da comunidade

Depois de receberem formação sobre situações de risco e catástrofe, os membros da Academia Sénior da Proteção Civil da Amadora partilham conhecimentos sobre prevenção e segurança com os pares, mas também com os mais pequenos. Para o município, o trabalho desenvolvido pelos agentes seniores tem sido “fundamental”, enquanto para uma das participantes, além de “enriquecedor”, é o que a “obriga” a sair de casa. O Expresso dá-lhe a conhecer o crescimento de um projeto que celebra dez anos

MartaCaeiro

“Não façam isso. Tenham cuidado. É perigoso.” A propósito de diversas situações do dia a dia, há dez anos que Carmo Amaral repete e partilha conselhos com amigos, vizinhos ou até desconhecidos. Foi em 2014 que se inscreveu, sem ter “a mínima ideia do que era”, na Academia Sénior da Proteção Civil da Amadora, projeto que começava na altura a dar os primeiros passos.

“Tive uma colega que teve uma situação com um micro-ondas, pôs a caneca e a água, quando foi tirar, explodiu na cara. Isso é uma das coisas que digo sempre às pessoas”, conta em conversa com o Expresso. Outro alerta que costuma deixar é sobre algo aparentemente simples. “Ir distraído a atravessar a rua, idosos sobretudo, não se apercebem do perigo que correm.”

Estes são apenas alguns exemplos entre o muito que Carmo, de 70 anos, diz ter aprendido desde que integra a Academia Sénior. “Agora vejo que tenho de ter cuidado também”, analisa. O objetivo da iniciativa é precisamente o de formar a população mais velha sobre os “principais riscos e perigos” existentes na cidade e “quais são as medidas de autoproteção associadas”, explica o coordenador municipal de Proteção Civil da Câmara da Amadora, Luís Carvalho.

Depois de uma formação que abrange temas tão variados como incêndios urbanos, sismos, inundações, burlas ou quedas no espaço público, os novos agentes seniores estão aptos para serem os próprios a transmitir o conhecimento que adquirem sobre medidas de segurança: entre pares, com ações de sensibilização em instituições como centros de dia, mas também a outras gerações, através de atividades nas escolas, dirigidas a crianças com quatro e cinco anos.

Agentes numa das atividades com crianças

Estar com os mais novos é o que mais preenche Carmo, reformada e agora dedicada ao voluntariado. “Para mim, as crianças são tudo. Aprendemos muito, quer com as crianças, quer com os outros idosos. Põem-se a contar histórias. A idade vai passando e vamos aprendendo uns com os outros”, relata. Além de ser “um trabalho enriquecedor”, há outro fator “muito importante”. “Obriga-me a sair de casa. E o convívio com as pessoas. Se não fosse isso, era capaz de não sair de casa como saio.”

Mas é também para a própria comunidade que o papel desempenhado pelos 36 agentes seniores já formados desde o início do projeto – com uma média de idades de 70 anos – faz a diferença. “Para nós tem sido fundamental. Têm um papel decisivo. Através sobretudo do esforço deles, neste momento conseguimos chegar a uma população sénior que não estávamos a conseguir até 2014. Isso é notório”, destaca Luís Carvalho, indicando que “cerca de 20%” da população da Amadora tem mais de 65 anos.

E os agentes “sentem uma valorização pessoal e social muito maior”. “Não estão em casa. Estamos a falar de pessoas autónomas, algumas delas estavam no centro de dia para passar o tempo e agora estão dados a esta causa. Têm um papel ativo na sociedade”, realça.

Dinamismo proporcionou crescimento

Algo que começou a partir de uma campanha das Nações Unidas destinada à construção de “Cidades Resilientes”, que encorajava o envolvimento da população “na lógica da redução do risco de catástrofe”, acabou por crescer devido ao “dinamismo” e “experiência de vida” dos participantes. “Pretendíamos formar um conjunto de pessoas dentro das instituições para poderem ser o portador da mensagem. E rapidamente percebemos que são pessoas com imensas valências e que querem mais”, retrata Luís Carvalho.

É por isso que, neste momento, os agentes seniores participam até em várias áreas de trabalho da Proteção Civil, por exemplo ajudando na logística ou em exercícios de simulacro, que acompanham enquanto “observadores e apontadores de notas e situações de anomalias”. Trata-se de uma “multiplicidade de ações” que os próprios “sugeriram e têm estado a implementar e a complementar o serviço”.

O que tem vivenciado representa, para Carmo, “uma surpresa”. “Não pensava em trabalhar com crianças quando me reformei. Tinha receio que acontecesse alguma coisa. Hoje em dia não, estou à vontade”, reconhece. A função de agente é, seguramente, para continuar. “Enquanto puder, contam comigo.”

Para o futuro, os objetivos da Academia incluem apostar numa participação “mais ativa” na parte operacional da Proteção Civil, ter “presença maior” nas escolas e continuar o trabalho realizado em locais públicos, elenca o coordenador municipal da Proteção Civil. “É a melhor maneira de conseguirmos ‘apanhar’ as pessoas: estão nos cafés ou nos bancos de jardim. Se colocar meia dúzia destes agentes da Academia Sénior a fazer sensibilização, o sucesso vai ser muito maior do que ser eu a fazer essa ação.”

O responsável considera também que este “projeto inspirador”, premiado em diferentes ocasiões, pode servir para “outros seguirem o exemplo”, aplicando-o com a necessária adaptação. Carmo é perentória: “Devia haver uma Academia Sénior nas outras cidades.”

Lançado em 2022, Longevidade é um projeto do Expresso – com o apoio da Novartis – com a ambição de olhar para as políticas públicas na longevidade, discutindo os nossos comportamentos individuais e sociais com um objetivo: podermos todos viver melhor e por mais tempo.

Este projeto é apoiado por patrocinadores, sendo todo o conteúdo criado, editado e produzido pelo Expresso (ver Código de Conduta), sem interferência externa.