Internacional

Corpo do ex-Presidente Jango Goulart vai ser exumado no Brasil

Antigo Presidente deposto pelo golpe militar de 1964 terá sido envenenado há 37 anos na Argentina, por agentes uruguaios, a mando do Governo brasileiro.

Maria Thereza Fontella(centro), víuva de Jango Goulart, com a filha Denise e o neto Marcos, numa conferência de imprensa em 2009 em Montevidéu, Uruguai, para apresentar novos documentos que reforçam a tese do assassínio
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Maria Luiza Rolim

Numa decisão inédita na história do Brasil, vai ser exumado o corpo de um Presidente da República, para tentar que seja confirmado, ou não, o seu possível assassinato, por envenenamento. João Jango Goulart faleceu em 1976 na Argentina, onde se encontrava exilado depois de ter sido deposto por um golpe militar em 1964.

De acordo com uma denúncia apresentada pela família - a viúva, Maria Thereza, filhos e netos -, Jango, como era conhecido, terá sido envenenado por agentes uruguaios infiltrados, a mando do regime militar brasileiro então no poder.

Último Presidente democrata antes da instauração da ditadura no Brasil, Jango Goulart governou o país entre 1961 e 1964, tendo sido deposto pelo golpe militar que foi apoiado pelos EUA. E morreu num hotel em Mercedes, Argentina, em circunstâncias consideradas estranhas, alegadamente de ataque cardíaco, segundo a versão oficial.

Político de esquerda, o ex-Presidente Jango Goulart integrou - durante o exílio na Argentina - a oposição de políticos brasileiros à ditatura (1964-1985). 

Jango terá sido vítima da Operação Condor

Há muitos anos que a Polícia Federal brasileira (PF) investiga a tese de possível assassínio do antigo governante. A 4 de abril de 2008, durante um encontro com correspondentes estrangeiros no Rio de Janeiro, o então ministro da Justiça, Tarso Genro, confirmou que estavam em curso "investigações sigilosas por parte da PF para verificar se é pertinente ou não abrir um processo formal policial".

A tese do assassínio chegou a ser investigada, mas acabou arquivada pelo Congresso brasileiro no início desta década. Em 2008, porém, as declarações do ex-agente secreto uruguaio Mário Neira Barreiro, que está detido por outros crimes na cidade de Charquedas, no estado do Rio Grande do Sul (de onde Jango era natural), fizeram reabrir o processo. Neira Barreiro confessou que participou no homicídio de Jango Goulart.

A 18 de março último, durante uma audiência da Comissão Nacional da Verdade - criada para investigar os crimes cometidos pela ditadura - a família do ex-Presidente entregou uma petição a pedir a exumação do seu corpo.

Na audiência, Rosa Cardoso, uma das integrantes da Comissão da Verdade, afirmou que a petição tinha "elementos concludentes" de que, afinal, Jango Goulart foi vítima da Operação Condor (ação conjunta de seis países da América do Sul, incluindo o Brasil, para reprimir opositores às ditaturas militares da região). Tese que é confirmada pelo historiador e coordenador do curso de História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Enrique Padrós.

No ano em que morreu, Jango - que era sistematicamente vigiado pelas secretas, como mostra um documento do Serviço Nacional de Informação - preparava o seu regresso ao Brasil para combater a ditadura.

Segundo o ex-espião do serviço de inteligência da polícia uruguaia, Neira Barreiro, os comprimidos que Jango Goulart tomava diariamente - para combater problemas cardíacos - foram trocados por outros que conteriam uma substância para acelerar os batimentos e provocar uma paragem cardíaca. "Os comprimidos (para matar Jango) vieram de França e foram recebidos pela gerência do Hotel Liberty", afirmou.