Os membros das sete economias mais poderosas do mundo já terminaram a sua reunião sobre o futuro da presença militar internacional no Afeganistão e, no entender da União Europeia, o fim da campanha não é sinónimo de abandonar o país à sua sorte. “O fim das operações militares no Afeganistão não é o fim do nosso compromisso de promover o Estado de direito, a democracia e os direitos humanos no mundo. Pelo contrário, temos de ser mais determinados do que nunca”, afirmou o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, em conferência de imprensa no final da reunião virtual extraordinária do G7, que se realizou esta terça-feira.
Charles Michel garantiu também que a EU vai fazer todos os possíveis para assegurar proteção aos afegãos que fogem do regime talibã, mas ressalvou que “ainda é cedo para saber que tipo de relação vai existir com as novas autoridades afegãs”.
Na manhã desta terça-feira, os representantes dos vários comités parlamentares de assuntos externos dos países do G7, emitiram um comunicado onde deixaram claro que a comunidade internacional deve evitar oferecer legitimidade ao novo governo, já que só depois de reconhecido é que o regime pode começar a pedir apoio a organizações internacionais como o Fundo Monetário Internacional.
O reconhecimento do governo (ou não) é uma das últimas armas de negociação das quais a comunidade internacional ainda dispõe para pressionar os talibãs a respeitar, por exemplo, os direitos das mulheres e meninas no país. De um dia para o outro, muitas foram impedidas de continuar a estudar ou trabalhar fora de casa. “A UE fará o seu papel para garantir a segurança e as condições de evacuação dos afegãos que desejem e será assegura proteção internacional aos que enfrentam perseguição”, garantiu Michel.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, também usou a disponibilidade financeira da UE para tentar pressionar os líderes talibãs. Ursula von der Leyen disse que a União Europeia tem um fundo de mil milhões de euros para ajudar o Afeganistão, mas que esse dinheiro está suspenso até que exista a garantia de que os direitos humanos vão ser respeitados.“Temos mil milhões de euros para o Afeganistão, mas esta assistência está congelada até que tenhamos uma garantia sólida e vejamos no terreno ações credíveis por parte dos talibãs de que as condições estão a ser cumpridas”.
Para von der Leyen é “um dever moral” da UE ajudar. “É um dever moral ajudar o povo afegão, fornecendo-lhe o máximo de apoio e condições tanto quanto for possível. A situação é uma tragédia para o povo afegão e um recuo para a comunidade internacional”.
Mesmo depois de conhecida a posição da administração norte-americana em não prolongar a data de saída, Charles Michel disse que “é importante tentar prolongar essa data”. “De qualquer forma, estamos a trabalhar para que a ajuda humanitária possa chegar ao país após essa data [31 de agosto]”, acrescentou.
A última pergunta da conferência de imprensa foi também aquela que gerou uma resposta mais estranha. Um dos jornalistas na sala perguntou qual é a opinião da Comissão sobre a proposta do chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, para a formação de um contingente militar de 50 mil pessoas para responder a situações como a do Afeganistão. “Não estou ao corrente dessa proposta”, disse von der Leyen, secundada por Charles Michel.
Biden mantém data de saída, Johnson pede que G7 use a sua “muito considerável influência”
O Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, decidiu que não vai alargar o prazo para a retirada das tropas norte-americanas do país, disse um membro da sua administração à agência Associated Press. Considerando os riscos de continuar com as forças no terreno a decisão foi a de completar todos os esforços de retirada até à próxima terça-feira. Mesmo assim, Biden pediu à sua equipa para preparar “planos de contigência” caso seja necessário, afinal, permanecer mais uns dias.
No fim da reunião, o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, participou também uma curta conferência de imprensa e garantiu que o G7 conseguiu “desenhar um mapa comum para as negociações com os talibãs”. Questionado sobre se tinha falhado em convencer o Presidente dos Estados Unido a alargar o prazo de retirada, Johnson esquivou-se à pergunta, apontando antes que, até esta terça-feira, o Reino Unido já retirou 9.000 pessoas de Cabul, em 57 voos: “um esforço enorme por parte do nosso pessoal militar”, classificou.
Johnson mostrou-se confiante que será possível “retirar ainda milhares de pessoas" do Afeganistão mas sublinhou que “a situação no aeroporto não está a melhorar”. “São momentos angustiantes para aqueles que estão tentando sair e é difícil para os nossos militares também”.
Sobre o tal roteiro para um entendimento com os talibãs, a condição “número um” e que o regime “tem de garantir até 31 de agosto e depois” é a “passagem segura para quem quer sair”. Ora durante a reunião do G7 os talibãs disseram precisamente o contrário, ou seja, que a saída de mais cidadãos vai ser impedida. “Alguns deles dirão que não aceitam, mas espero que vejam que não tem sentido porque o G7 tem uma influência muito considerável, seja ela económica, diplomática ou política”.
O primeiro-ministro britânico dedicou ainda alguns minutos da conferência de imprensa a tentar explicar o contexto histórico do Afeganistão “É preciso reconhecer que a história do Afeganistão é cíclica, infelizmente. Ao longo de diferentes épocas, diferentes forças expedicionárias foram enviadas por diferentes potências com o objetivo de desestabilizar o país. Temos de acreditar num mundo em que o povo afegão encontre a liderança, encontre a sabedoria de se unir, para que todas as facções possam chegar a um acordo sobre um caminho a seguir para aquele país”. “É muito difícil às potências ocidentais - concluiu o chefe do Governo britânico fazendo eco do que Joe Biden já tinha dito - impor este tipo de ordem a um país se o país não estiver disposto a fazê-lo sozinho”.