As condenações de Lula da Silva no âmbito da Operação Lava Jato foram todas anuladas por um juiz do Supremo Tribunal Federal, escreve a “Folha de São Paulo”
A decisão de Edson Fachin permite assim que o ex-Presidente brasileiro recupere os direitos políticos e volte a ser elegível para concorrer a cargos. Ou seja, neste cenário pode recandidatar-se às Presidenciais de 2022.
De acordo com a imprensa brasileira, Fachin declarou incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba relativamente aos casos do triplex do Guarujá, do sítio de Atibaia e do Instituto Lula. Isto significa que será agora a Justiça Federal do Distrito Federal a analisar os processos, que serão validados ou não.
"Com a decisão, foram declaradas nulas todas as decisões proferidas pela 13ª Vara Federal de Curitiba e determinada a remessa dos respetivos autos para a Seção Judiciária do Distrito Federal", pode ler-se na nota do gabinete de Fachin enviado à imprensa, aqui citado pelo "G1" do Grupo Globo.
As condenações que agora caem foram decretadas por Sergio Moro, que seria mais tarde ministro da Justiça do Governo de Bolsonaro, e por Gabriela Hardt, a sucessora de Moro no que tocou às investigações da Operação Lava Jato.
Entre acusações, condenações e agora este desfecho, Lula da Silva esteve preso 580 dias: recorde AQUI a cronologia dos acontecimentos até à sua libertação.
"O Brasil vive um acidente de percurso da nossa democracia e da nossa civilidade
Esta segunda-feira, a edição brasileira do "El País" publicou precisamente uma entrevista com Lula, na qual o ex-Presidente já apontava a 2022. O título da peça é: “Falta que a gente tenha uma próxima eleição para medirmos força com Bolsonaro”, uma frase de Lula, que governou o Brasil entre 2003 e 2010. O diário brasileiro descreve Lula, de 75 anos, como alguém em estado de graça, "um momento de energia em estado puro", depois de superar cancro, coronavírus e a prisão.
Lula descreveu ainda aquele país atualmente: "O Brasil vive um acidente de percurso da nossa democracia e da nossa civilidade por conta do Presidente Bolsonaro. Ele tem demonstrado não ter nenhuma preocupação com a seriedade, seja para tratar a covid, a economia, a educação ou a sua relação internacional. O Brasil sempre foi o país que não tinha problemas com país nenhum no mundo. O vírus é uma coisa da natureza. Enfrentar o vírus é da responsabilidade das políticas públicas dos governantes no mundo".
E acrescentou: "Aqui no Brasil, o Presidente desrespeita a ciência, receita remédio, não tem solidariedade, nem respeito pela vida. Se o Brasil vivesse um momento de democracia efetivamente, Bolsonaro já tinha sofrido o impeachment. Deixamos de comprar vacina quando poderia, vacinar quando deveria, e ele continua fazendo campanha contra o isolamento. É quase um genocida no tratamento da pandemia. O Brasil não merece isso."
Nota da defesa de Lula sobre a decisão do Ministro Edson Fachin:
Recebemos com serenidade a decisão proferida na data de hoje pelo Ministro Edson Fachin que acolheu o habeas corpus que impetramos em 03.11.2020 para reconhecer a incompetência da 13ª. Vara Federal Criminal de Curitiba para analisar as 4 denúncias que foram apresentadas pela extinta “força tarefa” contra o ex-presidente Lula (HC 193.726) — e, consequentemente, para anular os atos decisórios relativos aos processos que foram indevidamente instaurados a partir dessas denúncias.
A incompetência da Justiça Federal de Curitiba para julgar as indevidas acusações formuladas contra o ex-presidente Lula foi por nós sustentada desde a primeira manifestação escrita que apresentamos nos processos, ainda em 2016. Isso porque as absurdas acusações formuladas contra o ex-presidente pela “força tarefa” de Curitiba jamais indicaram qualquer relação concreta com ilícitos ocorridos na Petrobras e que justificaram a fixação da competência da 13ª. Vara Federal de Curitiba pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento da Questão de Ordem no Inquérito 4.130.
Durante mais de 5 anos percorremos todas as instâncias do Poder Judiciário para que fosse reconhecida a incompetência da 13ª. Vara Federal Criminal de Curitiba para decidir sobre investigações ou sobre denúncias ofertadas pela “força tarefa” de Curitiba. Também levamos em 2016 ao Comitê de Direitos Humanos da ONU a violação irreparável às garantias fundamentais do ex-presidente Lula, inclusive em virtude da inobservância do direito ao juiz natural — ou seja, o direito de todo cidadão de ser julgado por um juiz cuja competência seja definida previamente por lei e não pela escolha do próprio julgador.
Nessa longa trajetória, a despeito de todas as provas de inocência que apresentamos, o ex-presidente Lula foi preso injustamente, teve os seus direitos políticos indevidamente retirados e seus bens bloqueados. Sempre provamos que todas essas condutas faziam parte de um conluio entre o então juiz Sergio Moro e dos membros da “força tarefa” de Curitiba, como foi reafirmado pelo material que tivemos acesso também com autorização do Supremo Tribunal Federal e que foi por nós levado aos autos da Reclamação nº 43.007/PR.
Por isso, a decisão que hoje afirma a incompetência da Justiça Federal de Curitiba é o reconhecimento de que sempre estivemos corretos nessa longa batalha jurídica, na qual nunca tivemos que mudar nossos fundamentos para demonstrar a nulidade dos processos e a inocência do ex-presidente Lula e o lawfare que estava sendo praticado contra ele.
A decisão, portanto, está em sintonia com tudo o que sustentamos há mais de 5 anos na condução dos processos. Mas ela não tem o condão de reparar os danos irremediáveis causados pelo ex-juiz Sergio Moro e pelos procuradores da “lava jato” ao ex-presidente Lula, ao Sistema de Justiça e ao Estado Democrático de Direito.
[Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Zanin Martins, advogados do ex-presidente Lula]
*artigo atualizado às 22h23 com a introdução no artigo da nota da defesa de Lula da Silva na íntegra