Para Nancy Pelosi só há duas hipóteses — ou Donald Trump é destituído ou bem que podemos preparar-nos para ter um “Presidente-rei”, assim disse a presidente da Câmara dos Representantes em entrevista ao “Politico”. “Uma das acusações que recai sobre o Presidente norte-americano tem que ver com o seu pedido a um governo estrangeiro para intervir nas nossas eleições, colocando em causa a sua integridade. Se não o responsabilizarmos por isso, ele vai continuar a impedir que tenhamos eleições livres e justas. Se permitirmos que um presidente, seja ele qual for, faça isto, estaremos a dizer adeus à república e a dar as boas-vindas a um Presidente-rei”, afirmou Pelosi. Esta quarta-feira, a Câmara dos Representantes deverá aprovar duas acusações formais contra o Presidente por abuso de poder e obstrução do Congresso.
Uma das críticas que tem sido apontada aos democratas, no contexto do processo de ‘impeachment’ de Donald Trump, tem que ver com o “timing”, havendo quem tenha considerado que era demasiado cedo para a apresentação dos artigos em que Trump é, por um lado, acusado de abuso de poder, ao ter ameaçado reter uma ajuda financeira à Ucrânia até que o presidente Zelenskiy anunciasse a abertura de uma investigação ao filho do candidato democrata Joe Biden, e por outro, de obstrução ao Congresso, por ter alegadamente dificultado a investigação no caso ucraniano, omitindo documentos e impedindo que vários assessores da Casa Branca prestassem depoimento. Nancy Pelosi não reconhece, contudo, qualquer validade a essa crítica, notando que passaram “dois anos e meio” desde que o procurador Robert Mueller deu início à investigação a Trump”. “Não acho que estejamos a avançar depressa demais. E isto não tem nada que ver com rapidez, tem que ver com urgência”, acrescentou.
“Todas as ruas vão dar a Putin e isso preocupa-me”
Outra possibilidade que lhe parece remota tem que ver com a perda da maioria na Câmara dos Representantes por parte dos democratas, tendo em conta o pouco apoio que o processo ‘impeachment’ colhe junto de distritos norte-americanos específicos. “Não estou preocupada com isso. Isto não tem nada que ver com eleições, tem que ver com a Constituição, que acreditamos estar a ser violada, com Trump a colocar em causa a nossa democracia”. Sobre a sua relação com o Presidente norte-americano, pontuada, como referiu a jornalistas do “Politico”, “por altos e baixos”, Pelosi descreveu a relação como estritamente “profissional”. “Refiro-me, claro, à forma como eu lido com ele. Trump é o Presidente dos EUA e eu respeito isso. Tento colaborar quando posso, mas também tenho de honrar a Constituição quando isso se afigura necessário.” E várias vezes isso tem sido necessário, acrescentou Pelosi, lembrando decisões de Trump que, na sua opinião, só contribuíram para “beneficiar a Rússia”, como a de retirar as tropas norte-americanas do nordeste da Síria e permitir que Moscovo assumisse mais influência na região. “Todas as ruas vão dar a Putin e isso preocupa-me.”
Nancy Pelosi está, no entanto, confiante para as próximas eleições, ou não “fossem os candidatos democratas de grande qualidade”, sendo “qualquer um deles certamente melhor presidente do que o atual”. “Creio que aquilo que os americanos mais querem é um candidato com uma visão para o país e para o futuro do país. Alguém com um pensamento estratégico, seja sobre que assunto for — clima ou educação ou economia.” As palavras-chaves são precisamente estas, “visão, conhecimento e pensamento estratégico”, reforçou Pelosi. Isso e “autenticidade”, alguém que “se identifique de forma autêntica com as esperanças e os sonhos e as aspirações dos americanos”. Entre os candidatos democratas, há vários com estes atributos, não tendo Nancy Pelosi, portanto, quaisquer dúvidas de que os democratas vão ser capazes de manter a maioria na Câmara dos Representantes nas eleições de 2020. “Nós vamos conseguir fazê-lo. E aos candidatos republicanos só tenho a dizer isto: o vosso presidente está abaixo dos 50% de popularidade”.
Mulheres em número recorde
Outro dos temas da entrevista ao “Politico” foi o número recorde de mulheres que se sentam na bancada democrata do Congresso e presidem a comissões, “sete”, conforme referiu a jornalista. Fará diferença ter estas mulheres em lugares de poder? Em resposta à questão, Nancy Pelosi reconheceu que sim, que o número, em si, é importante (“quando cheguei ao Congresso havia 12 mulheres democratas e 11 republicanas num total de 435 congressistas e depois decidimos que teria de haver mais e, de facto, em 2018, foram eleitas 106 mulheres, 91 democratas e 15 republicanas”), mas mais importante “do que tê-las sentadas à mesa, é tê-las sentadas na mesa principal”.