O ataque militar sobre o Irão, ordenado esta quinta-feira pelo Presidente dos EUA, Donald Trump, e entretanto cancelado, é o mais recente desenvolvimento de uma escalada de tensões entre Washington e Teerão. Mas os alarmes começaram a soar há mais de um ano, quando, em maio de 2018, Trump anunciou a retirada unilateral americana do acordo internacional de 2015. Nesse acordo, o Irão comprometia-se a interromper o seu programa nuclear de produção de armas em troca do levantamento de sanções económicas.
A saída dos Estados Unidos era uma promessa de campanha de Trump, que se referia ao acordo, assinado durante a presidência de Barack Obama, como “o acordo mais estúpido de sempre”. Três meses depois do anúncio de retirada, Washington volta a impor uma primeira ronda de sanções contra Teerão, seguindo-se uma outra três meses mais tarde.
Entre novembro do ano passado e abril deste ano, as tensões não conheceram avanços significativos para lá da guerra de palavras e constante troca de acusações. No entanto, a 8 de abril, contrariando o Pentágono, Trump disse que iria designar a Guarda Revolucionária Iraniana como uma organização terrorista.
EUA ameaçam com “força implacável” em caso de ataque
Ainda em abril, o ministro iraniano do Petróleo, Bijan Namdar Zangeneh, acusava os EUA de terem cometido “um erro grave ao politizarem o petróleo e ao usarem-no como arma no estado frágil” em que se encontra o mercado. O governante reagia ao anúncio de que Washington não iria renovar as isenções para a compra de petróleo iraniano que abrangiam oito países, incluindo alguns dos maiores importadores do crude iraniano, como a China, a Turquia ou a Índia. O fim destas isenções, que permitiam a compra de petróleo iraniano sem violar as regulamentações norte-americanas, entraria em vigor a 2 de maio.
A escassos dias do aniversário do anúncio da retirada do acordo nuclear, o conselheiro de segurança nacional dos EUA, John Bolton, avisou que o país retaliaria com “força implacável” qualquer ataque iraniano. Bolton anunciou ainda a mobilização de um contingente adicional de forças americanas para o Médio Oriente, em resposta a “indicações e alertas” preocupantes do Irão. Teerão tinha prevenido que bloquearia o Estreito de Ormuz se fosse impedido de usar aquela hidrovia, por onde passa cerca de um quinto do petróleo consumido em todo o mundo.
Teerão endurece retórica sobre acordo e é acusado de sabotagem em alto mar
A 8 de maio deste ano, simbolicamente um ano após a saída unilateral americana, também o Irão anunciou que abandonaria parcialmente o acordo nuclear. Em reação, França, Alemanha, Reino Unido e a União Europeia no seu conjunto rejeitaram o ultimato de Teerão, que tinha dado dois meses às potências mundiais para se negociar um novo acordo nuclear – caso contrário, retomaria o enriquecimento de urânio, afirmou o Presidente Hassan Rouhani.
Em meados de maio, começam os ataques mal explicados em alto mar: dois petroleiros sauditas e quatro cargueiros dos Emirados Árabes Unidos foram alegadamente sabotados. A diplomacia iraniana advertia contra “conspirações por mal-intencionados para perturbar a segurança nacional” e pedia “vigilância dos Estados regionais perante qualquer aventureirismo de elementos estrangeiros”. A Rússia mostrava-se preocupada com a escalada de tensões entre Washington e Teerão, ainda que o secretário de Estado americano, Mike Pompeo, garantisse que os EUA não estavam interessados numa guerra com o Irão.
“Se o Irão quiser lutar, isso será o fim oficial do Irão”
Apesar de na frente diplomática se tentar pesar as palavras, Trump não o faz e larga o aviso: “Se o Irão quiser lutar, isso será o fim oficial do Irão. Não voltem a ameaçar os EUA!”. Também a Arábia Saudita, inimiga figadal do Irão e aliada dos Estados Unidos na região, já tinha dito que “na eventualidade de o outro lado escolher a guerra, o reino responderá com toda a força e determinação”. Teerão responde que só negociará com Washington quando os EUA mostrarem “respeito”, sublinhando não estar disposta “a conversar com pessoas que quebraram promessas” e avisando que, ao aumentar a presença militar na região, os americanos estavam “a jogar um jogo muito, muito perigoso”.
No início de junho, uma investigação multinacional aos ataques contra os petroleiros apresenta ao Conselho de Segurança das Nações Unidas os seus resultados preliminares: os ataques foram provavelmente obra de um “ator estatal”. A investigação não faz, no entanto, qualquer menção ao Irão, acusado pelos EUA de estar diretamente envolvido na sabotagem.
Novo ataque no mar e um drone abatido
Em meados de junho, novo episódio em alto mar: dois navios, um japonês e outro norueguês, são atacados no Golfo de Omã. Washington volta a apontar o dedo a Teerão, que recusa as acusações, lembrando que, no momento do ataque, o primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, estava de visita ao país. Os EUA divulgam então um vídeo que alegadamente mostra um barco iraniano a remover uma mina não detonada, numa tentativa, segundo Washington, de retirar provas do envolvimento de Teerão nos ataques.
Já esta semana, as autoridades iranianas anunciaram que até ao dia 27 ultrapassariam os limites de armazenamento de urânio definidos pelo acordo de 2015. O porta-voz da organização iraniana de energia atómica, Behrouz Kamalvandi, adiantou que a medida será revertida quando “as outras partes honrarem os seus compromissos”. Após o anúncio do recomeço de enriquecimento de urânio para fins militares, a Administração norte-americana autorizou o envio de mais mil soldados para o Médio Oriente, ao mesmo tempo que reforçou a promessa de que nunca deixará que o Irão se torne um Estado nuclear.
Os ataques desta quinta-feira, entretanto abortados, eram uma retaliação ao abate de um drone americano, de vigilância e não tripulado, no valor de 130 milhões de dólares (115 milhões de euros), que tinha sido atingido naquela manhã por um míssil terra-ar iraniano. Responsáveis americanos e iranianos trocaram acusações sobre a localização do drone quando este foi destruído. Washington garante que o aparelho se encontrava em espaço aéreo internacional, enquanto Teerão afirma que foi abatido depois de entrar no espaço aéreo iraniano.