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Imperador do Japão cede trono em vida ao seu filho: há 200 anos que não acontecia algo semelhante

Esta terça-feira sai o pai Akihito e no dia seguinte entra o filho Naruhito. Com a abdicação do primeiro e entronização do segundo, inicia-se uma nova era, a da harmonia. Na Constituição, o imperador é referido como “o símbolo do Estado”, apesar de ter funções cerimoniais. Mas Akihito operou importantes ruturas e Naruhito deverá seguir-lhe as pisadas

Imperador Akihito, esta terça-feira, durante a cerimónia de “adeus” ao trono japonês
Getty Images

O imperador do Japão, Akihito, abandona esta terça-feira o Trono do Crisântemo, tornando-se o primeiro imperador japonês a abdicar em mais de dois séculos. Para o seu lugar passa o filho primogénito Naruhito, que inaugura esta quarta-feira a era Reiwa, da harmonia, após 30 anos de Heisei, ou seja, de paz.

Apesar de constitucionalmente o imperador ser referido como “o símbolo do Estado”, as suas funções efetivas são, em grande medida, cerimoniais. Contudo, Akihito ampliou-as, aproximando-se das pessoas como talvez nenhum outro antes dele. Também a forma como deixa de ser imperador constitui uma novidade. Em dezembro de 2017, o Governo anunciou que Akihito abdicaria voluntariamente por causa da sua idade (tem 85 anos) e saúde debilitada. Foi necessária uma alteração legislativa para permitir a transmissão em vida do trono imperial.

As primeiras cerimónias privadas já começaram, com a invocação dos antepassados mitológicos da família imperial japonesa. A cerimónia principal começa às 17:00 locais (09:00 em Lisboa), com a entrada do casal imperial (Akihito e Michiko) na sala de Estado, onde permanecerá durante cerca de 10 minutos. Mais de 300 participantes também estarão presentes. A cerimónia termina com um discurso final de Akihito como imperador, ainda que tecnicamente continue no cargo até à meia-noite local.

O reduzido papel da mulher na família imperial

Na manhã de quarta-feira, Naruhito herdará os tesouros imperiais, cumprindo o seu primeiro ritual enquanto 126.º imperador da mais antiga monarquia do mundo e o primeiro a nascer depois da II Guerra Mundial.

Masako, a mulher de Naruhito, não está autorizada a assistir à entronização do marido. As mulheres não podem entrar na sala de investidura naquele que é, como escreve o jornal “The New York Times”, um dos muitos exemplos do estatuto reduzido das mulheres na família imperial japonesa.

Ainda assim, pelo menos no caso do casal imperial cessante, o casamento de Akihito com Michiko, à época uma plebeia, terá desempenhado um papel importante na humanização do então príncipe herdeiro. Depois de se juntar à família imperial, Michiko foi frequentemente vista a ajoelhar-se e a falar com o povo, uma conduta que Akihito viria a mimetizar. Foram várias as situações em que o casal se ajoelhou para abordar enfermos ou vítimas de catástrofes.

Caminho de rutura deverá ser prosseguido por Naruhito

Nem todos apreciam esta relação mais descomprometida com o protocolo, defendendo que o papel do imperador se deve restringir às práticas oficiais previstas na Constituição, como a realização de rituais e as boas-vindas a dirigentes estrangeiros. Os imperadores devem ter um relacionamento mais distante com o povo para manter a respeitabilidade e a mística do trono, argumentam.

No entanto, o caminho de rutura iniciado por Akihito deverá ser prosseguido pelo seu sucessor, como prognostica o presidente do Instituto do Oriente, Nuno Canas Mendes, num artigo do Diário desta segunda-feira que pode consultar aqui.