Internacional

May sofre baixa no Governo por negociar Brexit com Corbyn

Primeira-ministra e líder da oposição encontram-se quarta-feira à tarde em busca de uma solução para sair da UE. Abertura ao trabalhista causou uma baixa no Governo

Esta banca de uma livraria londrina reúne livros sobre o Brexit, sob a égide dos líderes conservadora e trabalhista
Pedro Cordeiro

A primeira-ministra do Reino Unido reúne-se esta quarta-feira com o líder do Partido Trabalhista para tentar resolver o impasse da saída da União Europeia (UE). Theresa May e Jeremy Corbyn encontrar-se-ão à tarde, em privado, depois do habitual frente-a-frente semanal na Câmara dos Comuns, ao meio-dia. A decisão de estender a mão ao líder da oposição foi anunciada pela governante na terça-feira, ao fim do dia, após sete horas de um agitado Conselho de Ministros. E custou-lhe um membro do Governo.

A ideia de May — cujo acordo de saída já foi rejeitado três vezes pelos deputados — é conseguir um compromisso com Corbyn para apresentar aos parceiros europeus. Se não for possível, explicou a dirigente conservadora, caberá ao Parlamento decidir um desenlace para a crise, que o Governo promete acatar.

Para tal será sempre indispensável voltar a adiar a saída, o que depende da autorização unânime dos restantes 27 membros da UE. A primeira-ministra defendeu um “adiamento curto”, que poderá ser até 22 de maio, para evitar a participação dos britânicos nas eleições europeias do próximo mês.

O roteiro parece tão sensato que é legítimo perguntar porque só aparece agora, a oito dias de um Brexit que, se nada disto funcionar, acontece automaticamente e sem acordo. O Reino Unido teve três anos para atingir um consenso sobre a saída da UE e o facto de não o ter feito exaspera os parceiros e as instituições europeias.

Consenso não é fácil

Outra pergunta evidente é como será possível conjugar o que até agora se revelou incompatível. May tardou em falar com Corbyn e este sempre se mostrou relutante em dialogar com a adversária, embora ontem se tenha apressado a exprimir disponibilidade. Sem maioria absoluta e refém das dezenas de eurocéticos radicais na bancada conservadora, a primeira-ministra temia que a aproximação aos trabalhistas dividisse o seu partido.

A decisão de conversar com o líder da oposição custou-lhe uma baixa no Executivo: o subsecretário de Estado para o País de Gales, Nigel Adams, demitiu-se esta manhã, alegando que May cometeu um “erro grave” ao “legitimar e voltar-se para Jeremy Corbyn em busca de ajuda nesta fase crucial, em vez de mostrar coragem”. Recordemos que nem a promessa de May se demitir caso o seu plano fosse aprovado comoveu os radicais.

Estes continuam a preferir uma saída sem acordo, que o Parlamento também rejeitou. A deputada trabalhista Yvette Cooper propõe esta quarta-feira um projeto de lei que proíbe o país de sair à bruta da UE. Deve ser votado à noite e May parece conformada com isso. “Se for essa a posição jurídica a que o Parlamento chega, os ministros não podem ignorá-la”, dizia esta manhã, na televisão, o responsável pela pasta do Brexit, Stephen Barclay.

Este eurocético, que está contra a união aduaneira e o segundo referendo, terá amargos de boca certos durante as negociações com Corbyn. Caso estas falhem, a bola volta para os deputados, que admitem agendar para segunda-feira uma terceira ronda de votações indicativas, depois de nas duas anteriores terem rejeitado oito e quatro propostas para sair do impasse, respetivamente, sem aprovar nenhuma.

Partidos divididos

A haver fumo branco entre May e Corbyn, as demissões no Executivo poderão ser mais, pois é quase certo que só pode haver terreno comum entre ambos a favor de um Brexit mais suave. O trabalhista tem exigido uma união aduaneira permanente com a UE (opção que, entre todas as que o Parlamento rejeitou, foi a que teve menos diferença entre votos contra e a favor), o que repugna a muitos conservadores.

A ala radicalmente antieuropeia ajudou a chumbar o acordo de May, que para já não voltará aos Comuns pela quarta vez, pois não teria possibilidade de passar. O Partido Unionista Democrático norte-irlandês, que sustenta o Governo minoritário, não o apoia. Por outro lado, não era claro que o speaker John Bercow autorizasse o regresso do plano ao debate. Mas os eurocéticos podem, com essa intransigência, tornar-se responsáveis por o país acabar por adotar uma saída que o deixe mais próximo da UE. A tal a que chamam “Brexit apenas no nome”.

Os trabalhistas também estão divididos. Se alguns deputados apoiam um segundo referendo ao Brexit, outros temem pelas consequências no seu eleitorado, pois representam zonas que votaram pela saída da UE. May está contra uma nova consulta popular, mas Corbyn adotou-a como política oficial. O chefe trabalhista é, contudo, um conhecido eurocético. Todos os demais partidos da oposição (liberais, nacionalistas escoceses e galeses e verdes) são mais pró-UE do que Corbyn.