Nove em cada dez portugueses afirma que o país beneficiou da entrada na então Comunidade Económica Europeia, hoje União Europeia (UE). Talvez por isso, quase metade dos inquiridos pelo Barómetro da Política Europeia, divulgado este mês pela Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS), concorde com a ideia de um novo alargamento. Segundo o estudo, 44,5% é favorável à entrada de novos Estados-membros.
Entre os países que reúnem maior preferência, a Ucrânia destaca-se de forma clara com 58%. Seguem-se a Suíça (5%), Turquia (4%) e a Noruega (3%), numa lista que conta ainda com a Albânia, o Reino Unido e a Sérvia.
Recorde-se que a Ucrânia oficializou o pedido de adesão à UE em fevereiro de 2022, no mês em que foi invadida pelas tropas russas, tendo recebido o estatuto de país candidato em junho do mesmo ano. As regras ditam que não é possível completar o processo enquanto a guerra continuar, ainda que as negociações oficiais tenham arrancado em dezembro de 2023.
Um dos temas que vem sendo discutido prende-se com os custos do aumento de Estados-membros da UE, em particular para países como Portugal que podem ver diminuída a quantidade de fundos comunitários recebidos. “O alargamento terá seguramente os seus custos. Os custos do não alargamento serão certamente muito superiores”, afirma Sofia Moreira de Sousa, representante da Comissão Europeia em Portugal.
“A minha tese é que os custos do não alargamento na situação geoestratégica que vivemos são existenciais, os custos do alargamento são circunstanciais”, defende João Vale de Almeida
Sofia Moreira de Sousa reconhece a importância de discutir os custos, mas prefere focar a conversa nas “oportunidades” da expansão do projeto europeu. “O alargamento não vai acontecer se não for positivo, necessário e, diria mesmo, imperativo para a própria União. O que é necessário é encontrarmos as soluções de forma a adaptar as políticas europeias para nos prepararmos para receber novos Estados-membros”, reafirma.
João Vale de Almeida, antigo embaixador da UE, dramatiza e alerta mesmo para o risco geoestratégico do não alargamento. “A minha tese é que os custos do não alargamento na situação geoestratégica que vivemos são existenciais, os custos do alargamento são circunstanciais”, defendeu, durante o debate sobre o Barómetro da Política Europeia organizado pela SIC Notícias. “Os primeiros são irreversíveis, os segundos são reversíveis”, sublinhou.
Mas há também quem olhe para esta questão como um copo meio-cheio. Para Henrique Burnay, professor no Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica de Lisboa, esta é uma oportunidade para Portugal afirmar a sua componente Atlântica. “O centro das prioridades geopolíticas [na Europa] está para Leste e não para o Atlântico. Esta transformação obriga-nos a repensar como é que nos vamos posicionar dentro da UE”, alerta. Portugal deve, reforça o especialista, tirar proveito do seu posicionamento geográfico para manter relevância no contexto europeu.
A importância de discutir a Europa
Quase uma semana depois do início dos debates a propósito das eleições europeias, que se realizam em Portugal a 9 de junho, parece claro que existe uma preocupação em manter a discussão centrada nos temas europeus. Porém, com a proximidade às legislativas e com o clima político muito aceso, o risco é de assistirmos a “uma segunda volta das legislativas”, aponta Henrique Burnay.
77%
dos inquiridos considera que Portugal tem menos influência na União Europeia, quando comparado com países de dimensão semelhante, como a Bélgica ou a Suécia
Numa altura em que o Barómetro da Política Europeia aponta que 77% dos portugueses consideram que o país tem menos influência do que nações de dimensões semelhantes, como a Bélgica ou a Suécia, falar dos desafios europeus é fundamental. Aliás, o mesmo estudo diz que a Alemanha (74,9%), França (13,3%) e Bélgica (2,3%) são percecionados como sendo os países mais influentes na UE, com Portugal a representar a escolha de apenas 0,6% dos inquiridos.
Para Henrique Burnay, há muitos temas importantes a discutir durante a campanha eleitoral, nomeadamente a relação entre a Europa e a China, os Estados Unidos e a Rússia, mas também assuntos menos ‘sexy’ como a regulação da inteligência artificial (IA). “A regulação da IA nunca se fará a nível nacional. É claramente um tema europeu”, exemplifica.
O estudo divulgado pela FFMS elenca ainda os assuntos em que os portugueses consideram que a UE tem maior responsabilidade, entre os quais o conflito israelo-palestiano, que 63,6% diz estar a ser gerido de forma insatisfatória. “Bem ou mal, acho que as pessoas pensam o que ouvem na televisão. Acham que a Europa não tem contribuído muito para resolver o conflito entre Israel e o Hamas, mas também não era provável que o conseguisse fazer”, diz Burnay. O professor de estudos políticos assinala que a “leitura do mundo resulta muito do que as pessoas vão vendo nas notícias” e isso deve levar a que a comunicação social se esforce por falar “sobre os temas europeus” nos “debates e nas entrevistas sobre as eleições”.
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