Estratégias

Investidores refugiam-se nas obrigações

O valor investido em fundos de obrigações pelos investidores nos últimos dois anos está ao nível do dinheiro aplicado em fundos de ações no período que antecedeu a " bolha" das ações tecnológicas, em 2002. Clique para visitar o canal Dinheiro

Nuno Alexandre Silva (www.expresso.pt)

O dinheiro que os investidores mundiais colocaram em fundos de investimento em obrigações nos últimos dois anos está ao nível do valor investido em 1999 e 2000 nos fundos de ações, período em que estava em formação a "bolha" das ações tecnológicas, as dot-com.

O investimento corresponde a mais de duas vezes a riqueza criada em Portugal no ano de 2009, num total de 480,2 mil milhões de dólares (377 mil milhões de euros). Nos anos de 1999 e 2000, o fluxo de investimento para os fundos de ações rondara os 496,9 mil milhões de dólares (391 mil milhões de euros), segundo as contas da agência Bloomberg e do Investment Company Institute.

As incertezas quanto à recuperação económica e à retoma do crescimento económico estão a levar os investidores a apostarem no mercado de renda fixa que viu as yields nas obrigações empresariais norte-americanas descerem para um recorde mínimo de 3,79%, na última semana, enquanto as yields das obrigações do tesouro estado-unidenses caíam para menos de 0,5%, o mínimo alguma vez registado.

Investimento em português

Em Portugal, os fundos de obrigações, fortemente resgatados há um ano, estão agora a captar mais atenção dos investidores. Segundo dados da Associação Portuguesa de Fundos de Investimento, Pensões e Patrimónios (APFIPP), nos últimos 12 meses, as subscrições líquidas (subscrições-resgates) de fundos de investimento em obrigações geridos por sociedades gestoras nacionais, passaram dos 1690 milhões de euros negativos em agosto de 2009 para os -200 milhões de euros em julho de 2010, com as subscrições a crescerem a um ritmo superior aos resgates. Três classes de obrigações estão mesmo com saldo positivo de entrada de dinheiro dos investidores. Desde agosto de 2009, os fundos de obrigações de taxa fixa (internacional e euro) e os fundos de obrigações internacionais juntaram mais de 28 milhões de euros às suas carteiras.

 No mesmo período, o retorno médio dos fundos de obrigações de taxa fixa internacional atingiu os 6,17%, o dos fundos de obrigações de taxa fixa euro alcançou os 2,84%, enquanto os fundos de obrigações de taxa indexada chegaram aos 3,28%. O Millennium Obrigações Mundiais, subiu 10,62% desde o início do ano, atingindo o melhor registo entre as cerca de duas dezenas de fundos de obrigações de taxa indexada geridos por entidades portuguesas e registados na APFIPP, mas no último ano são o BPN Conservador e o BPI Taxa Variável, dois fundos de taxa indexada, e o BPI Obrigações Alto Rendimento Alto Risco, de obrigações internacionais, que têm gerado maiores ganhos. Os dois primeiros ganharam mais 16,08% e 14,32%, respetivamente, enquanto as obrigações internacionais valeram ao fundo do BPI mais de 12% neste prazo.

Preocupação com "bolhas"

No entanto, o fluxo de investimento mundial nas obrigações equiparável ao da era do boom das ações tecnológicas começa a gerar apreensão. O fantasma da bolha das dot-com que levou o índice Nasdaq a perder 74% do seu valor desde o máximo de março de 2000 ao final de 2002 e que levou cerca de 6 biliões de dólares (4,72 biliões de euros) aos investidores poderá estar agora a transferir-se para o mercado das obrigações. "Em 2000 e finais de 1999, vimos quantidades massivas de capital entrarem nos mercados de ações na altura errada", lembrou à Bloomberg Tobias Levkovich, responsável máximo pela estratégia de ações dos EUA do Citigroup, revelando ainda que tem a mesma sensação "quando olha para todo este dinheiro a ir para obrigações".

Também Joel Levington, que dirige a área de crédito empresarial na gestora Brookefield Investment Management, indica que "eventualmente" o movimento de capitais para as obrigações "não vai ser sustentável". À Bloomberg, o responsável por mais de 24 mil milhões de dólares não determina é o prazo da inversão: "se isso significa cinco anos a partir de agora ou cinco semanas é difícil de dizer".

Fortes retornos e menor risco do que o mercado acionista tem sido a receita para mais dinheiro investido. As obrigações empresariais mundiais apresentaram retornos de 16,3% (em dólares) em 2009, segundo o índice Bank of America Merrill Lynch, quando antes nunca tinham ultrapassado os 8,86% anuais.