Contas Públicas

Banco de Portugal prevê mais excedente este ano, mas em 2024 economia crescerá menos e haverá mais desemprego

Em seis meses, o Banco de Portugal cortou para metade as perspetivas de crescimento do país para o próximo ano, estimando agora um avanço de 1,2%. Em 2023, o excedente será de 1,1%, mais do que o esperado por Medina. Inflação desce mais, mas desemprego fica acima dos 7% até 2026

Conferência de imprensa do relatório de estabilidade financeira com o governador do Banco de Portugal Mário Centeno e da Vice-Governadora Clara Raposo. © Nuno Fox
Nuno Fox

Portugal não está habituado a apresentar um excedente orçamental das contas públicas – isto é, a ficar com um saldo positivo depois de pagar todas as despesas estatais. Mas é o que deverá acontecer este ano e, segundo divulgou esta sexta-feira o Banco de Portugal, o valor será mais elevado do que o estimado pelo ministro das Finanças, Fernando Medina, quando apresentou o Orçamento do Estado para 2024.

“Estima-se que o excedente este ano possa atingir 1,1% do PIB, acima dos 0,8% previstos no Orçamento do Estado para 2024”, segundo o Boletim Económico apresentado pelo Banco de Portugal esta sexta-feira, 15 de dezembro. Já o Conselho das Finanças Públicas tinha considerado que o excedente iria ultrapassar o previsto pelo Governo e chegar a 1% do PIB. Há um ano, o OE para 2023 apontava para um défice de 0,9%, o que mostra a folga orçamental que foi conseguida, muito com a ajuda da inflação.

“Em 2023, a melhoria do saldo decorre do desaparecimento das medidas relacionadas com a pandemia e, em menor medida, do contributo positivo cíclico”, aponta o documento da autoridade liderada por Mário Centeno, que, enquanto ministro das Finanças, foi o responsável pela apresentação do primeiro excedente das contas públicas em democracia, em 2019, de 0,1% do PIB.

Questionado sobre esta revisão em alta do excedente, e tendo em conta o seu passado como ministro, Centeno disse que era preciso cautela na utilização dos excedentes. “Guardemos algum respeito face a aumentos da receita que podem não ter uma característica permanente muito forte. Não devemos assumir responsabilidades que, sendo permanentes, possam vir a causar desvios, no sinal contrário, nos momentos seguintes”, declarou o governador na conferência de imprensa que teve lugar no Museu do Dinheiro, em Lisboa, esta sexta-feira, 15 de dezembro.

Excedente vai repetir-se em 2024

Se há um efeito base mais positivo no que diz respeito às contas públicas para 2024, isso não vai impedir que o excedente em 2024 seja inferior ao previsto pelo Governo na ótica do Banco de Portugal. O abrandamento da economia justifica essa evolução, a par de medidas de caráter permanente de apoio à economia. A projeção aponta para 0,1%, abaixo dos 0,2% estimados no Orçamento do Estado para 2024 – documento que foi aprovado apesar da queda do Executivo.

O OE prevê que seja criado um fundo para alocar tais excedentes, para vir a financiar investimentos, mas não há consenso generalizado para vir a pô-lo em prática. Ainda ontem o jornal Público fez uma análise em que mostrava que só um dos candidatos socialistas (José Luís Carneiro) apoiava essa opção, ao contrário de Pedro Nuno Santos (que queria utilizá-lo em medidas no presente) e do presidente social-democrata, Luís Montenegro.

Sem défices, a dívida continuará a convergir para 100% do PIB este ano, continuando depois a reduzir-se. “Estes patamares de redução de dívida pública são essenciais. A redução da dívida é uma prioridade e é algo que vemos omo possível de continuar nos próximos anos e está nestas previsões”, declarou o governador. Deverá, em 2026, descer dos 90% do PIB.

Fernando Medina, ministro das Finanças, terá maior excedente do que o esperado
Nuno Fox

Corte no crescimento do PIB para metade em seis meses

Seja como for, o Banco de Portugal acredita num abrandamento da economia. No espaço de seis meses, as projeções de crescimento para 2024 foram cortadas para metade. Em junho, o Boletim Económico esperava uma expansão do PIB de 2,4%. Depois, em outubro, houve uma redução substancial, para 1,5%. Agora, no Boletim Económico de dezembro, a projeção está nos 1,2%, depois de um crescimento de 2,1% em 2023, como já estava estimado em outubro.

Em relação à anterior projeção, há um menor contributo da procura interna, compensado pelas exportações, mas há uma queda não compensada do investimento (mas será esta rubrica a explicar por que razão Portugal crescerá mais do que a média europeia): “A economia portuguesa deverá continuar a crescer acima da área do euro, 0,5 pp (pontos percentuais) em média entre 2024 e 2026”, acredita o Banco de Portugal.

“É uma desaceleração da atividade económica em Portugal, que já se iniciou ao longo do ano de 2023 e perdurará durante mais alguns trimestres”, declarou Mário Centeno na conferência de imprensa que teve lugar no Museu do Dinheiro, em Lisboa.

Para 2025, o crescimento é de 2,2% (mais uma décima que no último boletim), e há agora uma projeção para 2026, de 2%.

Inflação continua a reduzir-se

“A inflação deverá prosseguir a trajetória descendente, reduzindo-se de 5,3% em 2023 para 2,9% em 2024 e para 2% até ao final do horizonte de projeção. Esta diminuição reflete os efeitos desfasados da redução de custos de produção e das decisões de política monetária do Banco Central Europeu”, segundo o Boletim Económico de dezembro, que apresenta, assim, valores mais baixos que em outubro (5,4%, em 2023, e 3,6%, em 2024). É uma tendência idêntica à que a equipa de estatísticas do Banco Central Europeu divulgou esta semana.

A última decisão do BCE foi de manter a taxa de juro em 4,5%, com Christine Lagarde a garantir que não houve discussão sobre corte nas taxas de juro, ainda que as taxas de mercado apontem para reduções este ano.

Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu, não revela corte de juros para este ano
RONALD WITTEK/EPA

Projeção aponta para mais desemprego

As novas projeções do supervisor apontam para mais desemprego. Se no Boletim Económico de outubro não se esperavam taxas de desemprego superiores a 7% nem em 2024, nem em 2025, agora a taxa estará sempre acima da fasquia, pelo menos até 2026, o último ano das novas projeções.

O Banco de Portugal assume-se como o mais pessimista neste campo entre as instituições com estimativas macroeconómicas, em que a barreira dos 7% não tem sido superada.

“O mercado de trabalho continua a apresentar uma situação favorável, apesar da quase estabilização do emprego, esperando-se um aumento dos salários reais. Projetam-se aumentos do emprego de 0,8% em 2023, 0,1% em 2024 e 0,3% em 2025-26”, indica o documento.

Notícia atualizada pela últim vez com declarações da conferência de imprensa pelas 11h55