Economia

OE2022 chumba no rigor e transparência orçamental, na avaliação dos peritos do Budget Watch

Défice até deverá ficar abaixo da meta do ministro das Finanças. Mas o painel do "Budget Watch", que junta 16 peritos nacionais, não dá mais do que 47,4% à proposta de Orçamento para 2022

O Orçamento do Estado (OE) para 2022 proposto pelo ministro das Finanças, Fernando Medina, não obteve mais do que 47,4% na avaliação feita pelos economistas da iniciativa Budget Watch quanto ao rigor, transparência e responsabilidade orçamental.

Ainda assim, estes peritos orçamentais consideram que o défice poderá ficar abaixo da meta de 1,9% do PIB. “Tudo indica que existe uma subestimação das receitas fiscais”, afirmam. A verificar-se, “e dado o carácter mais rígido da despesa, é provável haver uma subestimação do saldo global”, lê-se no documento preparado pelo IPP - Institute of Public Policy.

O Budget Watch tem sido uma parceria entre o IPP, o ISEG e a Deloitte, que entra agora na sua 13.ª edição. Também é a 13.ª vez que um OE é chumbado pelo Budget Watch. Desde 2010, o pior foi o OE2012 (20,5%) e o menos mau o OE2020 (48%). A nota do OE 2022 (47,4%) sobe face ao OE2021 (45,9%), mas mantém-se ainda no “insuficiente”.

Nesta edição registam-se as votações dos seguintes economistas do Conselho Científico Consultivo do Budget Watch: António Afonso (ISEG), Eduardo Costa (NOVA-SBE), Francesco Franco (NOVA-SBE e IPP), Francisco Nunes (ISEG), Joana Andrade Vicente (IPP), João Ferreira do Amaral (ISEG), João Jalles (ISEG), José Alves (IPP), José Silva Costa (FEP), Linda Veiga (U. Minho), Luís Teles Morais (NOVA - SBE e IPP), Manuela Arcanjo (ISEG), Paulo Trigo Pereira (ISEG e IPP), Ricardo Reis (LSE), Susana Peralta (NOVA - SBE e IPP) e Teresa Garcia (ISEG).

A análise pretende ser exclusivamente técnica, independente e objetiva, à luz de boas práticas internacionais de prestação de informação e do processo orçamental e não das opções democráticas legítimas de qualquer governo.

Principais recomendações

Os peritos orçamentais do Budget Watch deixam várias recomendações quanto ao processo de descentralização em curso, a saúde, a segurança social, o sector empresarial do Estado, o investimento público ou as parcerias público-privadas (PPP). Também pede melhorias quanto ao processo orçamental e a análise da sensibilidade, rigor e natureza da política orçamental e responsabilidade política.

“Existe claramente margem para se melhorar o modelo de desagregação da informação financeira em termos setoriais e territoriais, quer na administração local quer na administração regional, com vantagens que daí adviriam para uma melhoria da transparência e qualidade da informação orçamental”, diz o Budget Watch, por exemplo, em matéria da informação sobre os diferentes níveis da administração pública e do tratamento das transferências relacionadas com o processo de descentralização.

“As secções relativas à despesa em saúde deveriam estar consolidadas na mesma secção, de modo a permitir uma leitura integrada e completa. O nível de detalhe relativo à despesa de capital e investimentos no setor da saúde é muito reduzido. Seria relevante detalhar o histórico de execução orçamental, a calendarização dos investimentos e as respetivas fontes de financiamento (em particular, dos fundos europeus)”, critica o Budget Watch. Este teme que “na ausência de algumas medidas estruturais, na área dos recursos humanos e mecanismos de gestão, o reforço orçamental poderá não evitará o agravar das dificuldades sentidas no Serviço Nacional de Saúde”.

Na Segurança Social “seria desejável maior clareza na separação dos orçamentos relativos ao sistema de proteção social de cidadania, por um lado, e ao sistema previdencial, por outro, os quais têm lógicas de funcionamento completamente diferentes”. Na realidade, “o OE não dá uma visão clara nem da despesa global em pensões (nunca aparece esse valor), nem em prestações sociais em geral (também não)”.

Quanto às empresas públicas, falta “elaborar um quadro síntese, à semelhança do que faz na Conta Geral do Estado com o esforço financeiro líquido do Estado com o sector empresarial, que inclui indeminizações compensatórias, aumentos de capital, transferências de capital, empréstimos, e em sentido inverso dividendos das empresas públicas fora do perímetro orçamental que continuam a ser de apenas duas (Banco de Portugal e CGD)”.

Sobre o investimento público, importa dar “algum detalhe sobre o investimento previsto para além dos investimentos estruturantes”, que representam apenas um terço do valor total. “Deveria haver uma justificação mais clara acerca dos desvios entre os valores orçamentados e executados dos investimentos estruturantes, para perceber a natureza dos entraves à boa execução destes projetos de investimento e investir na correção dos mesmos”.

No que às PPP diz respeito, “seria desejável que fossem apresentados os principais pressupostos dos cálculos da despesa, e que fossem usados para explicar divergências das previsões realizadas em diferentes anos”.

Os economistas do Budget Watch criticam ainda a falta de “novidades no processo orçamental, incluindo o estado de situação da implementação da nova Lei de Enquadramento Orçamental”.

No que toca a análise da sensibilidade, rigor e natureza da política orçamental, o Budget Watch pede, por exemplo, a discriminação da “totalidade das medidas discricionárias de despesa (montante global e detalhe das principais), a evolução das despesas não discricionárias, e o impacto de ambas na evolução do saldo orçamental. Recomenda-se nesse sentido uma informação clara sobre os saldos ajustados do ciclo e estruturais o que não acontece”.

No domínio da responsabilidade política, o relatório do OE devia apresentar, por exemplo, “um quadro síntese com a despesa efetiva consolidada de cada programa orçamental no ano orçamental (t) e no anterior (t-1), e a variação percentual (com análise), permitindo uma leitura imediata das prioridades de despesa”.