Luiz Felipe Scolari tinha um plano de jogo do qual nunca fez segredo. Todos o conheciam de ginjeira: eu, ele, ela (Regina, a psicóloga do escrete), elas (Dilma e Merkel), eles (brasileiros e alemães), o leitor, a leitora e, claro, Löw. O sargentão do bigode carismático queria mais do mesmo, uma blitzkrieg, como quem se pergunta: se era para ir para a guerra, porque não ir com tudo e em força? Do ponto de vista dele, não havia outra estratégia possível. Porque Neymar estava lesionado e Thiago Silva castigado, e porque Alemanha não só era melhor como era versátil e - esta dizemo-la nós - tinha um treinador mais capaz. Sejamos honestos: infinitamente mais capaz. E isso viu-se. E sentiu-se.
Scolari, contra a Alemanha, ia apostar tudo (menos o bigode dele e do Murtosa) na emoção, no hino gritado, na pressão descontrolada com cabelos desgrenhados, à espera que uma bola ressaltasse para o desajeitado Fred e este fizesse o que só fizera até então de cabeça.
Para tal, o Brasil teria de apertar a toda a largura e toda a profundidade, indo buscar forças a um deus maior que é brasileiro no país do futebol. O xamã Scolari até uma corrente de energia mística mas pouco misteriosa inventou, cobrindo a cabeça de uma equipa inteira com um boné #ForçaNeymar como se Neymar estivesse numa luta entre a vida e a morte, deitado numa cama de hospital e não na sua residência, em Santos, transformada num lugar de culto para evangelizados de Scolari. Bater a Alemanha era uma questão em que a fé e as conversas de divã se iriam sobrepor à razão e à realidade. Só que até a crença e as ciências sociais têm limites quando a realidade é fria e cruel e dá razão aos que veem uma ciência num desporto em que uma bola é chutada por 22 tipos. E, aí, esta Alemanha de Löw é barra.
Os alemães aguentaram aqueles dez minutos de correria louca dos brasileiros, cobertos e encobertos pela tática e por um guarda-redes gigantesco, tranquilos à espera dp momento certo para sair da trincheira e avançar sobre o inimigo. Se Scolari queria uma blietzkrieg à alemã, Löw serviu-lhe a tática da terra queimada soviética: partiu-lhe os canais de comunicação (ligação entre centrais, meio-campo e ataque esfrangalhada), roubou-lhe os transportes (tapando Oscar e Hulk) e destrui-lhe o bem mais precioso (o coração) em apenas 18 minutos. Dos 11 aos 29:
0-1, por Thomas Müller
0-2, por Miroslav Klose (16 golos em mundiais, recorde absoluto)
0-3, por Toni Kroos
0-4, outra vez por Kroos
0-5, por Sami Khedira
A coisa estava má, ficou bera e daí em diante só podia piorar para os brasileiros, que tinham uma hora pela frente para remoer a humilhação de serem eliminados da Copa, Em casa, diante da classe média que criticou o Mundial mas que não se poupou para encher estádios. E que chorou como o povão chora.
Os golos são sete, e os pecados também
O filme da segunda parte também estava escrito: o Brasil ia entrar forte porque a conversa no balneário, em que Scolari apelaria à pátria amada e ao orgulho, faria efeito. De pouca duração. Aos poucos, as palavras do motivador foram-se diluindo e a superioridade alemã acentuou-se e acentuou-se um bocado mais até se tornar um peso insuportável para o Brasil e os brasileiros. David Luiz e companhia faziam de cada lance o último lance da vida deles; e, inevitavelmente, David Luiz e companhia viam-se apanhados em contrapé porque tinham trocado os pés pelas mãos a atacar. Resultado? Dois golos de Schürrle e o golinho de honra de Oscar quando os alemães estavam a pensar no Maracanã.
7-1, um resultado histórico, à hóquei em patins, que mostra que, na Alemanha, tudo corre sobre rodas.