Tudo o que não seja ganhar o Mundial será um fracasso para o Brasil. A perspetiva é, por um lado, motivante - e Felipão, mestre em jogos psicológicos com os jogadores, irá certamente tentar tirar proveito disso -, mas, por outro, uma pressão quase tão brutal como aquela que a polícia aplicou para dispersar os manifestantes contra a Copa, em São Paulo, junto ao Itaqueirão, onde a prova começou.
Não surpreende, por isso, que os brasileiros tenham entrado em campo perante a Croácia com um grau muito elevado de ansiedade. As emoções ficaram, aliás, logo à flor da pele durante o hino, que a FIFA quis encurtar, mas o 'povão' não deixou. A música parou, mas tanto os jogadores como os 60 mil que enchiam a Arena de São Paulo continuaram a cantar a versão integral do hino a plenos pulmões, num momento que deixou o guardião Júlio César a chorar desalmadamente.
O início da parte teve mais Brasil do que Croácia, mas sem grande ascendente. Os croatas, que eram Modric, Rakitic, Kovacic e pouco mais (que falta faz Mandzukic na frente), estiveram sólidos e tiveram alguma felicidade em chegar à vantagem, quando Marcelo (mal posicionado na abordagem ao lance) introduziu a bola na própria baliza, aos onze minutos.
O Brasil começava a perder e pairavam sobre Scolari dois fantasmas. O primeiro, com ar de diabinho, lembrava o selecionador que faz hoje precisamente dez anos desde o primeiro de dois jogos de má memória para os portugueses. Com Scolari no leme, Portugal abriu o Euro-2004 com uma derrota perante a Grécia, por 2-1, e apesar das coisas terem melhorado a partir daí, voltaram ao mesmo na trágica final da prova (Grécia 1-0 Portugal).
O outro fantasma, com ar de anjinho, recordava a Scolari que, no Mundial-2002, os brasileiros também começaram a perder, perante a Turquia, mas deram a volta e ganharam 2-1. E, no final, Scolari acabou por levar o Brasil ao penta, derrotando a Alemanha, por 2-0.
O mini show de Neymar
As divagações foram entretanto interrompidas por um "minino", como diria Felipão, que já começou a fazer de tudo para ganhar o título de craque da Copa: Neymar. Para além de bater todas as bolas paradas do Brasil, estreou os cartões amarelos do Mundial, quando deu uma cotovelada em Modric, fazendo lembrar clássicos Barcelona-Real Madrid de outras épocas, e, depois, marcou o primeiro golo do escrete na prova (na baliza certa).
Aos 29 minutos, Neymar fez o 1-1 e voltou a galvanizar o Brasil, mas a vantagem para os da casa só surgiria aos 70 minutos, num brinde do árbitro japonês Yuichi Nishimura (que - lá vêm as divagações outra vez - fez lembrar os "presentes" do árbitro egípcio Gamal Ghandour no Espanha-Coreia do Sul dos quartos de final do Mundial-2002, em que os espanhóis foram epicamente vilipendiados).
Fred, que pouco mais fez durante a partida, atirou-se claramente para a psicina e o árbitro foi na conversa, marcando uma grande penalidade que seria convertida por Neymar. Estava desempatado um jogo equilibrado, que podia pender para qualquer um dos lados, mas a Croácia ainda teve tempo de assustar Júlio Cesar, com um remate perigoso de Perisic em cima dos minutos finais.
Na sequência da jogada, Oscar fugiu sozinho pelo meio-campo croata e, num remate quase de bico (só mais uma divagação: fez lembrar os remates de Romário), o genial Óscar fez o 3-1 final. Não foi fácil, mas o que conta é a vitória, que deixa o Brasil um passo mais perto do sonho do hexa.