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Maria Teresa Horta (1937-2025): “A paixão pode magoar, mas é tudo o que há de mais maravilhoso”

Em 2017, Maria Teresa Horta lançava o livro “Poesis”, com a certeza de ser a sua própria poesia. No dia da sua morte, aos 87 anos, republicamos a entrevista, feita nesse mesmo ano, sobre a infância e a génese de uma mulher-poetisa insubordinada, desobediente e apaixonada

António Pedro Ferreira

Artigo publicado originalmente a 8 de agosto de 2017, na revista do Expresso


Maria Teresa Horta posa para a fotografia. Sobre ela paira um candeeiro. Um globo na forma de uma gota pendente que a mão de um anjo ou de uma mulher agarra. Para a poetisa, é a mão de uma mulher, uma mulher com asas. Quando era pequena, conta, costumava deitar-se no chão e ficar a observar essa figura tão insubmissa e desobediente quanto ela própria quis ser. Ou provou ser, quando publicou “Minha Senhora de Mim”, em abril de 1971, incomodando ‘os bons costumes’ da ditadura de Salazar, que não perdoava às mulheres a escrita erótica; ou quando escandalizou mais uma vez o regime com “Novas Cartas Portuguesas”, que escreveu juntamente com Maria Isabel Barreno e Maria Velho da Costa; ou quando se recusou a receber o Prémio D. Dinis, da Fundação Casa de Mateus, das mãos de Pedro Passos Coelho, atribuído ao seu livro “As Luzes de Leonor”, sobre a sua quinta avó, a marquesa de Alorna. Com traduções de poemas seus em inglês, edições a sair em França de “A Dama e o Unicórnio” (2013), um livro de poesia acabado de publicar, “Poesis” (2017), e muitos poemas ainda por escrever, Maria Teresa Horta conversou sobretudo sobre a infância, a mãe, o pai, a família... De outra forma não poderia ser para uma mulher que acredita que somos a nossa génese ou que quem escreve tem de entender de onde vem. Ainda mais quando a escrita se confunde com o próprio ser e se diz: “Eu sou a minha poesia.”

Parabéns, no mês de maio completou 80 anos!
Nem me diga isso. Detesto fazer anos desde pequenina. Tenho uma fotografia, aos 3 anos, com a mão estendida: “Não quero!” E não é que o meu filho nasce exatamente como eu? Um dia fui dar com ele sentadinho numa escada, a chorar. “Magoaste-te?”, perguntei-lhe. “Não”, disse ele. “Não quero fazer anos!”

Porque é que não gosta?
Não gosto de festejar. Sou pouco de festejos, a não ser que seja pela liberdade. Estou sempre pronta para uma manifestação. Também gosto de festejar os aniversários dos meus netos e do Luís [o marido].

Nunca percebeu porquê?
Não, e fiz 17 anos de psicanálise. Nunca percebi porque me angustia desde pequenina. O meu pai perguntava-me porquê. E eu dizia: “Não quero. Não quero. Faz-me mal!”