É preciso topete

O Tribunal Constitucional já deu para este peditório

Paulo Gaião

No acórdão 353/2012, que fiscalizou a constitucionalidade do corte de subsídios de férias e de Natal, o Tribunal Constitucional foi "amigo" do Governo.

Ao abrigo do nº 4 do artigo 282º da Constituição, o Tribunal Constitucional restringiu os efeitos da declaração de inconstitucionalidade e manteve os cortes nos subsídios em 2012, só sendo repostos em 2013. O governo embolsou 1,2 mil milhões de euros.

De que valeu ao Tribunal Constitucional esta decisão, sensível aos problemas económicos do país?  

O governo queria um TC sempre dócil, passando vistos à sua política.

Quando o TC começou a chumbar as medidas de austeridade do executivo sem dar abertura  ao contexto económico que o país vive, o Palácio Ratton passou a força de bloqueio da política do governo.

No acórdão 603/2013 de ontem, que declarou inconstitucionais várias normas do Código do Trabalho, o Tribunal Constitucional podia ter restringindo os seus  efeitos ao abrigo do mesmo nº 4 do artigo 282º da Constituição, limitando os efeitos só para o futuro.

O Tribunal Constitucional podia ter invocado razões de segurança jurídica ou interesse público para  o fazer.

De modo a que, por exemplo, aqueles que foram despedidos ao abrigo das normas consideradas inconstitucionais não pudessem vir a ser reintegrados.  Mas o Tribunal Constitucional não o fez.

Há hoje uma linha divisória perfeitamente definida.

O governo invoca o interesse público, como está a fazer nas providências cautelares contra as 40 horas de trabalho para os funcionários públicos.

Mas é uma defesa do interesse público deformada pelas necessidades económicas e pelo discurso do governo de que não há alternativa às medidas tomadas. Assenta quase exclusivamente em razões de ordem política, e é dificilmente aferida por critérios técnicos.

Talvez seja por isso que o Tribunal Constitucional  não corre o risco de invocar o interesse público. Se o fizesse entrava na política. Como talvez tenha feito quando manteve o corte dos subsídios de férias e de Natal em 2012.