Há 3 dias atrás, Ursula von der Leyen, Presidente da Comissão Europeia, afirmou que os idosos podem ter de manter o isolamento social até ao fim do ano por causa do novo coronavírus. Reconheceu que é difícil ficar isolado até 2021, mas insistiu em pedir disciplina e paciência aos que sentem com especial força o peso de cada minuto roubado.
Não há dúvida alguma de que tudo o que fizemos até aqui foi essencial. Sabemos que as medidas de distanciamento social se destinam a proteger os grupos de risco, como os idosos. É terrível, mas na ausência de vacina, na ausência de medicação eficaz e antes do controlo desejado do Covid, a única arma de que dispomos é o afastamento social. O estado de emergência permite que sejam tomadas medidas excecionais, para que o SNS resista e para que a comunidade sobreviva como um todo.
Simplesmente, sabemos que a partir de um determinado momento vamos começar, lentamente, a fazer a nossa vida em novos moldes. Nada será como antes. Ainda não sabemos como decorrerão os dias após o isolamento sem vacina, mas certamente teremos de nos proteger e de proteger terceiros, tentando que saúde e vida mais ou menos habitual se conjuguem, porque precisamos de sair disto com um país de pé.
Precisamos, também, de sair disto como gente. Todas as pessoas precisam de ver as suas pessoas, todas as pessoas precisam de passear, ainda que com restrições, todas as pessoas precisam de algum sentido de normalidade.
O que não é normal é o discurso da clausura dos idosos por tempo indeterminado como se gente acima de certa idade, que vive em contextos muito diferenciados, não tivesse autonomia individual, autodeterminação, capacidade de tomar decisões, incluindo a capacidade de escolher quais os riscos de saúde que quer ou não assumir.
Não se pode esperar com enorme tranquilidade que homens e mulheres acima de 65 anos fiquem fechados em casa ou em lares por meses e meses, sem direito ao mundo exterior, sem direito ao afeto, sem direito a escolher. Quando estivermos em período de regresso à normalidade, as pessoas idosas não podem ser condenadas a morrer da precaução. Pelo contrário, temos de as respeitar enquanto cidadãos e cidadãs capazes de fazerem as suas escolhas, livres naquilo que não afete terceiros, gente que ainda quer ser gente.
Haverá restrições comportamentais?
Certamente. E os contextos diferenciados terão de ser avaliados, porque é diferente viver-se sozinho, com a família, em casal ou num lar.
Não podemos aceitar que se fale dos idosos como um terceiro neutro, um grupo mudo, destinatário silencioso, sem voz, de normas hipotéticas de isolamento de meses e meses como se a saúde fosse o único valor a proteger, como se cada idoso e cada idosa não tivesse direito, como qualquer pessoa, ao seu plano de vida.