Sociedade

Tratado do Alto Mar vai entrar em vigor, mas é "apenas um ponto de partida"

Aprovado em junho de 2023, após anos de negociações, o texto visa responder às múltiplas ameaças que incidem sobre o Oceano. Só agora recebeu as assinaturas de 60 Estados

Gary John Norman

A organização não governamental (ONG) High Seas Alliance sublinhou este sábado que, apesar de ser um marco histórico, a entrada em vigor do tratado para proteger o mar alto "é apenas o ponto de partida”.

Com as ratificações de Marrocos e Serra Leoa, o tratado atingiu na sexta-feira as 60 ratificações, após o que se inicia um período de 120 dias para entrar em vigor no final de janeiro.

A diretora da High Seas Alliance, Rebecca Hubbard, disse num comunicado que “este momento histórico é o culminar de anos de dedicação e diplomacia global por governos e partes interessadas”.

Aprovado em junho de 2023, após anos de negociações, o texto visa responder às múltiplas ameaças que incidem sobre o oceano.

O tratado – formalmente designado Acordo sobre Proteção da Biodiversidade Marinha em Áreas para além da Jurisdição Nacional – “é um poderoso testemunho do multilateralismo – mostrando o que o mundo pode alcançar quando nos unimos pelo bem comum do nosso oceano, que cobre mais de 70% do planeta”, defendeu Hubbard.

A entrada em vigor do acordo “marca um passo importante, quando as promessas começam a tornar-se ações”, acrescentou a diretora da ONG.

Catarina Abril, técnica de Pescas e Clima da associação ambientalista Sciaena, que faz parte da High Seas Alliance, relembrou que “pela primeira vez, a comunidade internacional dispõe de um instrumento jurídico à escala global para criar áreas marinhas protegidas em águas internacionais e salvaguardar a biodiversidade em ecossistemas frágeis e vulneráveis, como os montes submarinos".

Mas Rebecca Hubbard sublinha que “alcançar 60 ratificações não é a meta final – é apenas o ponto de partida”.

“A verdadeira força do tratado reside na participação universal”, acrescentou a ativista, que apelou à ratificação por mais países até à primeira conferência para avaliar a implementação do documento, que deve acontecer no final de 2026.

A High Seas Alliance disse esperar mais ratificações durante a Semana de Alto Nível da Assembleia Geral da ONU em Nova Iorque, que começa na segunda-feira.

"O sucesso deste tratado dependerá, no entanto, de uma participação e colaboração proativa das entidades responsáveis pelas atividades para lá da jurisdição nacional", acrescentou Catarina Abril.

“Saúdo este êxito histórico para o oceano e o multilateralismo”, reagiu o secretário-geral da ONU, António Guterres, em comunicado, na sexta-feira, assim que se soube das ratificações.

“Quando enfrentamos uma tripla crise planetária – alterações climáticas, perda de biodiversidade e poluição – este acordo é uma linha de vida para o oceano e a humanidade”, acrescentou.

A Fundação Oceano Azul também manifestou a sua satisfação por o Tratado do Alto-Mar ter alcançado o número de ratificações necessárias para entrar em vigor.

Em comunicado, a fundação criada pela família Soares dos Santos “congratula efusivamente este momento histórico, que irá mudar o atual paradigma da governação internacional do oceano”.

Apenas cerca de um por cento do mal alto é objeto de medidas de conservação. Mas em 2022, o conjunto dos Estados comprometeu-se, durante a 15.ª Conferência das Partes (COP15) sobre biodiversidade, a proteger, até 2030, um terço da terra e do oceano do planeta.

Mas esta perspetiva é ameaçada pela posição de duas potências marítimas: EUA e Federação Russa.

Moscovo distanciou-se do texto desde a sua aprovação, por considerar alguns elementos inaceitáveis, e Washington, que o assinou durante a Presidência de Joe Biden, não o deve ratificar enquanto Donald Trump estiver na Casa Branca.