Com a subida do custo de vida em Portugal, devido à inflação e ao aumento generalizado dos preços, os estudantes universitários estão "em risco" de abandonar os seus cursos e, ao mesmo tempo, "desenvolver stress crónico" e outros problemas como ansiedade e depressão. O alerta é deixado por Carla Faria, docente na área da psicologia no Instituto Politécnico de Viana do Castelo.
“Os estudantes vão confrontar-se com dificuldades que, até agora, não eram tão salientes e recorrentes. Sem recursos financeiros mínimos, vão desistir, desinvestir, e entrar numa situação de stress crónico com um potencial enorme para dar origem a uma doença", antecipa.
Para mitigar os efeitos desta crise na saúde mental dos estudantes universitários e prevenir o aparecimento de problemas graves, foi criado um projeto no Instituto Politécnico de Viana do Castelo (IPVC). Visa ajudar os alunos a desenvolverem competências que lhes permitam "adaptar-se às exigências do ensino superior", e "superar dificuldades" com que possam ser confrontados ao longo do percurso académico, explica Carla Faria, coordenadora do RES4ALL+ Promoção da Resiliência e da Saúde Mental Positiva dos Estudantes.
O projeto foi um dos vencedores da primeira edição do concurso FLAD/OPP – Saúde Mental no Ensino Superior, resultado de uma parceria entre a Fundação Luso-Americana e a Ordem dos Psicólogos Portugueses. O objetivo da iniciativa é apoiar o desenvolvimento de projetos de intervenção psicológica que contribuam para uma "menor incidência" dos problemas de saúde mental entre os estudantes, que "atingiram níveis muito elevados devido à pandemia", explica a FLAD no seu site.
Mais de 80% dos alunos não têm com quem falar sobre “coisas importantes”
São duas as linhas de intervenção do projeto. Consiste, por um lado, na implementação de um programa de "saúde mental positiva", isto é, focado na prevenção da doença e no aumento da literacia em saúde mental, e por outro lado na criação DE um espaço universitário "amigo da saúde mental" — um Campus Resiliente, como refere o projeto. A iniciativa arrancou recentemente, abrangendo as várias escolas do IPVC.
"A ideia surgiu depois de termos percebido que havia indicadores preocupantes em termos de saúde mental dos estudantes", explica Carla Faria, adiantando que o gabinete de saúde dos Serviços de Ação Social da instituição registou um aumento dos pedidos de ajuda psicológica por parte de estudantes no pós-pandemia.
Mesmo antes da pandemia a situação era "preocupante". Em resposta a um inquérito realizado em 2020, cujos resultados foram partilhados com o Expresso, quase 8% dos alunos afirmaram ter problemas de saúde mental, destacando-se a ansiedade e a depressão. Cerca de 36% estavam a ser acompanhados por profissionais de psicologia ou psiquiatria na altura em que o estudo foi feito. Mais de metade referiram, além disso, não estar "satisfeitos" com o seu sono (60,7%) e a mesma percentagem admitiu a necessidade de ter mais informação na área da saúde mental.
Numa outra avaliação, realizada aos estudantes do instituto em 2019, mais de 80% admitiram não ter com quem falar sobre "coisas importantes" — ou ter apenas "às vezes" — e cerca de 60% referiram que “não se consideram membros de um grupo comunitário e/ou de autoajuda".