O documento, elaborado por um grupo de trabalho coordenado pelo conselheiro João Joanaz de Melo, teve por base um vasto número de audições e recolha de dados junto de autoridades nacionais e da Agência Europeia do Ambiente, que apontam para factos alarmantes. Entre estes, o de 75% dos habitats e 62% das espécies (sobre os quais existe informação em Portugal) se encontrarem em “estado mau ou desfavorável”.
“Muito pouco do que se pratica é gestão efetiva do território e dos seus valores patrimoniais”, critica o biogeógrafo e conselheiro Miguel B. Araújo. A constatação da “ausência de gestão ativa das áreas protegidas é opinião unânime entre as entidades consultadas pelo CNADS, incluindo organizações não-governamentais do ambiente, empresas e até municípios”, reforça Joanaz de Melo. E lembra que “a falta de eficácia e de eficiência na gestão das áreas protegidas” se deve a várias razões, entre as quais a extinção da figura de diretor de área protegida (em 2007-2008), seguida da passagem dos planos de ordenamento dos parques e reservas naturais a ‘programas’, em 2014 (criando disfunção ao nível da hierarquia dos instrumentos de gestão do território), agravada pela falta de meios humanos e financeiros. Em jeito metafórico, explica, “é como pôr uma carroça a andar com rodas quadradas”.
As críticas estendem-se a diferentes Governos. Para o CNADS, estamos “perante uma oportunidade única para mudar de rumo” e pôr Portugal no caminho defendido pelo Pacto Ecológico Europeu, que “consagra a conservação da natureza e o restauro da biodiversidade como o novo paradigma de afirmação em que assenta o desenvolvimento e o bem-estar social”.
Entre as recomendações propostas no documento constam o reforço do papel de coordenação, regulação, planeamento e monitorização do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF); dotar as áreas protegidas de uma equipa técnica própria, liderada por um diretor executivo, com uma direção colegial que “cumpra objetivos de cogestão colaborativa”; e a criação de meios e instrumentos para cumprir uma gestão eficiente, dotando cada área de orçamento próprio e autonomia de gestão. Para financiar isto tudo, o CNADS propõe “a aplicação do princípio do utilizador-pagador”, o que passa pelo estudo de aplicação de taxas turísticas ou de portagens para não residentes.
“Se é possível no parque de Doñana ou nos Picos da Europa, em Espanha, e em vários parques nos EUA, e se cá já é aplicado €1 para atravessar a Mata da Albergaria, no Parque Nacional do Gerês, porque não há de ser possível noutras áreas protegidas?”, interroga Joanaz de Melo. Perante a diversidade dos parques naturais em Portugal, muitos com aldeias e vilas dentro, “é preciso estudar caso a caso”. Miguel Araújo defende que “o país que inventou a Via Verde pode com certeza criar um mecanismo para cobrar aos utentes o uso das áreas protegidas”.
Os especialistas lembram que os serviços prestados pelos ecossistemas permitem a salvaguarda de biodiversidade, o sequestro de carbono, a regulação do ciclo hidrológico ou a prevenção de incêndios, assim como paisagens magníficas para recreio e lazer, além de salvaguardarem património cultural e natural. Os conselheiros lembram que sendo a maior parte do território privado, os proprietários devem perceber que “proteger a natureza é tão ou mais rentável que destruí-la”. E defendem mais investimento em educação e sensibilização para a Natureza. “É absolutamente crítico acabar com a ausência generalizada de ações de educação e sensibilização e lembrar que não se faz educação ambiental fechado na escola ou atrás de um computador”, sublinha Joanaz de Melo. E lembra que “esta reflexão pretende inverter o declínio da biodiversidade e a perda de habitats, e isso só se faz com o reconhecimento do problema pela opinião pública”.