SIM Não penso que Pavel Durov seja nem um herói nem um mártir da liberdade de expressão. De resto, nem o próprio se assumiu como tal, contrariamente ao megalómano bilionário Elon Musk na sua cruzada brasileira. O dono do Telegram foi de uma enorme moderação no post que publicou dias após a sua libertação: embora considerando que as autoridades francesas tenham tido uma “abordagem errada”, reconheceu que o Telegram não era perfeito e manifestou a esperança de que “os acontecimentos de agosto” tornem o “Telegram — e o sector das redes sociais no seu conjunto — mais seguro e mais forte”. E posteriormente publicou um outro post referindo que, “enquanto 99,999% dos utilizadores do Telegram não têm nada a ver com o crime, os 0,001% envolvidos em atividades ilícitas criam uma má imagem para toda a plataforma, colocando em risco os interesses dos nossos quase mil milhões de utilizadores” e dando nota de diversas alterações na rede para combater essa realidade. É caso para ficarmos descansados e dizer, com Shakespeare, que “tudo está bem quando termina bem”? Não me parece. Não sou partidário de quaisquer teorias de conspiração, mas também não posso ignorar que o palco onde se desenrolam estes “acontecimentos” não se caracteriza propriamente pela simplicidade, transparência ou linearidade. A hipercomplexa relação entre as grandes redes sociais e os Estados, recheada de conflitos, avanços, recuos, cedências, acordos não divulgados e roturas, não nos permite a nós, meros consumidores de informação e utilizadores dessas redes, ter a pretensão de sabermos tudo o que se passa ou se passou em determinado “acontecimento”.