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Nuno Artur Silva: “O meu olhar é o do argumentista. Sou aquele que estou sempre a olhar da perspetiva de quem vai escrever histórias”

O argumentista Nuno Artur fez 60 anos e carrega já uma vasta experiência de vida. Iniciou o seu percurso na década de 90 do século XX escrevendo textos de humor para Herman José, depois fundou as Produções Fictícias, lançou inúmeros talentos na área da comédia, assinou outros inúmeros programas de humor, como o “Contra Informação”, participou na construção do “Inimigo Público” e no “Eixo do Mal”. Depois de tudo isto e de ainda mais alguma coisa, foi administrador da RTP e, até há poucos meses, secretário de Estado do Ministério da Cultura. A partir desta experiência, atravessada pela pandemia e por outras cogitações, vai estar no palco do São Luiz, em Lisboa, para nos contar o que viveu nestes últimos anos. É um espetáculo de Stand Up Comedy, acompanhado pelo ilustrador António Jorge Gonçalves, companheiro de várias aventuras, que vai desenhando em tempo real as palavras do autor . “Onde é que eu ía?” Tem estreia marcada para esta quinta-feira, dia 12, e às oito sessões inicialmente previstas, entretanto já esgotadas, foram acrescentadas outras tantas de modo a o espetáculo ser prolongado. Decorre até ao dia 29 deste mês


“Onde é que eu ia?” é uma tentativa, várias vezes interrompida, de se apresentar a solo em palco. O que é que aqui retoma?
Várias coisas. Em Janeiro de 2005, decidi arriscar fazer sozinho uma espécie de Stand Up Comedy que se chamava “Nuno Artur Silva, a sério?”, onde falava sobre diversas coisas nesse registo de comédia, enquanto o Jorge desenhava e os Dead Combo tocavam. Estávamos ainda na primeira semana das apresentações quando fui convidado para integrar a administração da RTP e acabei por não o fazer. Quando, ao fim de três anos saí da RTP, retomei a ideia desse espetáculo, recomecei a prepará-lo com algumas alterações e já sem os Dead Combo, quando, inesperadamente, me convidaram para integrar o Ministério da Cultura, enquanto Secretário de Estado para o Cinema Audiovisual e Média, para trabalhar com a ministra de então, Graça Fonseca. Três meses depois de iniciar as minhas funções começou a pandemia. O que de algum modo também voltou a interromper todo o trabalho que estava a preparar. Quando finalmente a pandemia começou a desanuviar e ia retomar o plano de restruturação para o Cinema e o Audiovisual, caiu o governo. Portanto o ponto de partida deste “Onde é que eu ía?” é o que acontece na nossa vida quando estamos a planear qualquer coisa e de repente tudo muda. Neste caso, não mudou só o que aconteceu na minha vida mas também o que aconteceu ao país, desde logo com a pandemia, e também com o mundo com a guerra, a crise e a inflação.

Nesse sentido “Onde é que é ia”, é uma espécie de revisão de matéria?
Essa frase agrada-me muito enquanto título porque precisamente contém todas as possibilidades. Também há aqui uma outra dimensão, um pouco mais filosófica, e que basicamente tem a ver com esta ideia de percebermos que o homem é o homem e a sua circunstância. Aquilo que me interessou foi cruzar essa circunstância de eu ser um cómico em funções governativas. A narrativa começa pelos anos do governo, onde eu olho para esta realidade em que a pandemia paralisou completamente o setor cultural, mas depois também faço um recuo aos anos da minha passagem pela administração da RTP e acaba por ser sobre a passagem em que estive em funções de poder e em que, exatamente oito anos depois, regresso exatamente ao lugar do crime: o palco do São Luiz. A graça é que toda esta reviravolta, que aconteceu na realidade, parece ser uma reviravolta de argumento sobre um tipo que escrevia piadas, muitas delas sobre política, e que de repente está no governo a fazer política.