Da última vez que, por ocasião da publicação de “Aviary” (2018), falei com Julia Holter, ela insistira muito na forma como encarava a relação entre música e palavras, considerando que a sonoridade destas era um ponto de partida mais decisivo do que o seu significado: “Tenho sempre presente a ideia de que, quando colocamos palavras numa música elas deixam de ser realmente palavras, linguagem, e transformam-se em puro som. Por vezes, quando se sofre um AVC, as pessoas esquecem as palavras, mas continuam a ser capazes de cantar uma canção e recordam-se das palavras dela. Isto é, o nosso cérebro processa a linguagem de forma diferente se for cantada.” Agora que, seis anos, uma gravidez, um parto, o confinamento pandémico e a morte de vários familiares depois, lhe volto a falar do assunto a propósito do novo e belíssimo “Something in the Room She Moves”, nada parece ter-se alterado: “Quando chego ao momento em que começo a compor, concentro-me apenas nos sons e só mais tarde me preocupo em prestar atenção ao que o subconsciente me dita, sem refletir demasiado nisso e sem nenhuma atitude crítica. Mas estou sempre a trabalhar esse aspeto, é um ponto especialmente interessante para mim essa relação entre o som das palavras e o significado delas. É um enigma particularmente difícil de resolver, um enorme desafio que me entusiasma imenso.”
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Seis anos de enigmas musicais de Julia Holter
Seis anos, uma gravidez, um parto, uma pandemia e a morte de vários familiares depois, Julia Holter traz-nos “Something in the Room She Moves”. Ao Expresso, fala de divertimento e criatividade