António Costa e Luís Montenegro conhecem-se “há muito tempo”. Longe de terem a mesma relação que Costa tinha com Rui Rio, e que já vinha dos tempos em que ambos eram presidentes de câmara, o primeiro-ministro reuniu-se esta tarde com Luís Montenegro e fez questão de não mostrar nada mais senão “amabilidade” para com o novo líder do PSD - que foi eleito com a missão de fazer oposição cerrada a António Costa.
Mas se Luís Montenegro saiu de São Bento em silêncio, sem prestar quaisquer declarações para não fazer o que Rui Rio fez em 2018 e não ser acusado de ser "muleta do PS", António Costa aproveitou o vazio e fê-lo por ele. Disse que a reunião foi longa porque foi a primeira que ambos tiveram na “qualidade de primeiro-ministro e líder da oposição” e porque é “dever do Governo passar informação o mais pormenorizada possível sobre os diversos temas, desde a política externa, de defesa e segurança interna às questões financeiras”.
O novo líder do PSD tem prometido pulso firme e, esta semana, em declarações ao Expresso, criticou duramente o primeiro-ministro mostrando-se empenhado em dar um "banho de realidade". Mas as divergências, para já, ficam na gaveta. “A retórica política faz parte da vida, e quem se aflige com as críticas que os adversários políticos lhe dirigem é melhor mudar de vida”, diria Costa quando questionado pelos jornalistas sobre as acusações que Luís Montenegro lhe faz de insensibilidade social e de não usar o excedente da receita fiscal para ajudar quem mais precisa. “É como os jogadores de futebol”, continuou Costa. Quem entra em campo sabe que pode levar umas “caneladas”.
O subtexto era só um: as "caneladas" da política não inviabilizam entendimentos - nem no grande dossiê do aeroporto, onde António Costa insistiu em virar o ónus para o PSD, que está a fazer "audições" internas sobre o tema e, até ver, não rejeita negociar.
Acordo para o aeroporto? “Não entrámos no pormenor”
Depois do caso ‘Pedro Nuno Santos’, o acordo para o aeroporto ficou em banho-maria à espera de uma negociação com o PSD. Questionado pelos jornalistas no final da reunião, que acontece três semanas depois do congresso do PSD e três semanas depois do episódio da quase-demissão de Pedro Nuno, Costa não esclareceu se há margem para acordo ou se o PSD vai deixar o Governo decidir sozinho - como tem dito. Nova reunião será marcada “em breve”.
O aeroporto, contudo, foi apenas “uma pequena parte” da conversa, sublinhou várias vezes António Costa, detalhando que Luís Montenegro teve a “amabilidade” de lhe transmitir que o PSD está a fazer um debate interno sobre o tema e que, por isso, ficaram de marcar uma outra reunião. Ou seja, haverá princípio de acordo - mas “não chegamos ao pormenor e ao detalhe”, disse Costa aos jornalistas quando questionado sobre os termos da negociação. Se avança a Avaliação Ambiental Estratégica, se será adjudicada a outra entidade, se a opção Montijo é ou não para avançar.
Há “urgência” no “importante acordo” sobre o aeroporto, disse Costa, mas é “compreensível” que o PSD leve o seu tempo para se organizar. E o Governo espera, como o Expresso tinha adiantado há três semanas.
Estabilidade até 2026
É um novo quadro político, que António Costa quer que seja dialogante, previsível, com credibilidade externa e "estável". Daí que, nas declarações aos jornalistas esta tarde, tenha defendido a importância de o maior partido da oposição se organizar e "construir uma alternativa" para chegar a "2026" e a apresentar aos portugueses.
Nessa altura, como agora, os eleitores escolherão que caminho querem. "A escolha, desta vez, foi feita de forma clara e inequívoca e vamos ter vários anos de estabilidade, o que é bom, e dá tempo à oposição de construir a sua própria alternativa", disse. Enquanto isso, haverá espaço para divergências e para consensos. "Há algumas matérias sobre as quais é importante que haja acordos e eu tenho insistido que, em relação às grandes Infraestruturas, haja um amplo consenso nacional, porque são obras que duram décadas e que ultrapassam legislaturas", continuou.
A longa conversa, segundo Costa, decorreu de forma “serena”, foi uma conversa “interessante”, e “agradável”. “Estabelecemos metodologias de trabalho e pontos de contacto com a nova direção do PSD”, sublinhou várias vezes um primeiro-ministro que tinha de estar às 15h em Coimbra - com Pedro Nuno Santos - e que, apesar de estar atrasado, ainda falou longamente aos jornalistas nos jardins de São Bento.
Artigo corrigido às 16h50, retira a menção ao tratamento por "tu" entre António Costa e Montenegro depois de ouvido o áudio das imagens captadas no início da reunião