O Chega avançou com um pedido de realização de uma comissão parlamentar de inquérito ao caso dos ucranianos recebidos por associações ligadas ao regime russo. Para isso, é necessário que um quinto dos deputados dê luz verde a uma tal comissão numa altura em que a Assembleia da República discute, na especialidade, o Orçamento do Estado. O presidente do partido, André Ventura, sinalizou esta terça-feira que há “abertura” dos outros partidos para que esta comissão de inquérito se realize, apoiando-se nos “contactos informais” que assegura ter mantido com as outras forças políticas.
Em declarações aos jornalistas no Parlamento, Ventura revelou existirem “suspeitas muito graves” de que entidades governamentais receberam a informação, “há vários anos”, de que associações registadas como ucranianas “eram, na verdade, associações pró-russas”. E falou mesmo em “suspeitas fundadas - objetivas, não subjetivas”, sublinhando não serem suspeitas do seu partido, mas “de quem várias vezes confrontou as autoridades”. O líder do Chega acrescentou que uma dessas associações foi “retirada” enquanto associação ucraniana este ano, já depois do início da guerra na Ucrânia, embora não saiba dizer qual.
As buscas da Polícia Judiciária na Câmara de Setúbal, noticiadas esta manhã, não devem impedir “o escrutínio político que esta casa [o Parlamento] tem de fazer”, defendeu ainda. E atirou que “a chave” será o PS, declarando ter a certeza de que os socialistas compreendem “a urgência que o país vê nesta questão”. Em simultâneo, Ventura apontou o dedo ao PS por este partido ter impedido a audição do presidente da Câmara de Setúbal: “provavelmente o que ele ia dizer era ‘não sou eu que registo as associações como ucranianas ou como russas, é o Governo’”.
“Podemos estar perante, e eu digo-o com todas as palavras, atos de espionagem”, alertou, acrescentando que o seu partido já manifestou “abertura total” para que algumas audições decorram “à porta fechada” e “em absoluto sigilo” para não comprometer “em nada” a segurança nacional. Recuperando as palavras da véspera do secretário-geral do PCP, Ventura assegurou que “ninguém quer tutelar o poder autárquico”. “Queremos é perceber como é que a informação de que estas associações eram financiadas pelo Kremlin ou ligadas a Moscovo não chegou nem à Câmara de Setúbal - ou chegou e foi ignorada -, não chegou ao primeiro-ministro ou à ministra da Presidência - ou foi ignorada -, ou o que os serviços secretos sabiam”, concretizou.
Definindo uma comissão parlamentar de inquérito como “o mecanismo adequado” para fazer “o escrutínio político” destas questões, Ventura mostrou-se disponível para retirar “de bom grado” o seu pedido e apoiar o de outro partido. “O importante é haver uma comissão de inquérito. Cá estaremos para apoiar a nossa ou outra qualquer”, garantiu. Se não conseguir o apoio dos 46 deputados necessários, o Chega não exclui tentar avançar para uma comissão potestativa. “Não há mais tempo para fugir desta questão”, rematou, destacando a “estranheza” de estas informações não terem chegado às “mais altas esferas do Estado” quando “tantas associações ucranianas” têm alertado para o assunto “desde 2011”.