Política

Pedro Nuno critica direção do PS nas presidenciais e confirma que apoia Ana Gomes

Ministro criticou Marcelo Rebelo de Sousa por não ter exigido um acordo parlamentar para assegurar a estabilidade da legislatura. Medina reafirmou o apoio a Marcelo. Proposta de primárias no PS não foi votada

JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA

Já começou a reunião em que o PS discute, finalmente, a questão das eleições presidenciais - e as divisões já começaram a aparecer. Com a direção do partido a propor a liberdade de voto, Pedro Nuno Santos falou não só para confirmar que apoia Ana Gomes na corrida como também para criticar tanto a gestão que o partido tem feito nesta pasta quente como o papel de Marcelo Rebelo de Sousa na 'instabilidade' da atual legislatura.

Já era esperado que António Costa optasse por propor ao partido, primeiro nos círculos mais restritos (secretariado nacional, que se reuniu esta sexta-feira, e comissão política, reunida esta manhã) e depois num órgão mais alargado (a comissão nacional) que nenhum candidato recebesse um apoio oficial, dando carta branca aos militantes para votarem em Marcelo Rebelo de Sousa, em Ana Gomes (a única candidata da área socialista, até ver) ou num dos candidatos da esquerda. Como a Lusa noticiava esta manhã, fora de causa, na proposta da direção do partido, estaria colocar André Ventura nesse leque de opções.

Mas a gestão do dossiê não é pacífica. E se já na reunião da comissão política, esta manhã, se tinham ouvido algumas críticas - Jorge Lacão, por exemplo, criticava o processo, em que até agora os órgãos do partido não tinham sido envolvidos - Pedro Nuno Santos encarregou-se esta tarde de fazer esse reparo, numa das intervenções mais aguardadas, ou não fosse o ministro o principal rosto da ala mais à esquerda no PS e um dos nomes sempre referidos para uma futura candidatura à liderança.

Na megarreunião por zoom, Pedro Nuno confirmou que apoiará mesmo Ana Gomes. Já tinha dado pistas neste sentido, tendo anteriormente garantido que “nunca” votará num candidato de direita “com outra visão de sociedade” e defendido que por norma “deve haver sempre um candidato da área do PS”. Mais recentemente, chegou a repudiar os ataques feitos a Ana Gomes por alguns dirigentes e lembrando que uma candidata que já representou diversos cargos em nome do PS não deve depois ser “vilipendiada”.

Mas, segundo apurou o Expresso, o ministro foi mais longe, criticando o tempo que demorou esta reunião a ser marcada - o PS ainda não tinha discutido formalmente esta pasta - e culpando Marcelo Rebelo de Sousa pelo atual momento de instabilidade política, incluindo por não ter exigido acordos parlamentares nesta legislatura, ao contrário de Cavaco Silva.

A intervenção não caiu bem junto de todos os presentes, tendo logo havido quem sublinhasse algumas ausências de Pedro Nuno nas reuniões do secretariado nacional do PS, desde logo a que decorreu ontem, e também no encontro da comissão política desta manhã. Segundo a Lusa, durante a comissão nacional o vice-presidente da bancada socialista Porfírio Silva concretizou a crítica, considerando essa ausência "particularmente grave" atendendo aos ataques do ministro dirigidos à direção do partido.

Se a opção pela liberdade de voto já era esperada, mesmo entre os que apoiam Ana Gomes, a corrente minoritária de Daniel Adrião, crítico de António Costa, insistiu em tentar submeter uma proposta para que fossem realizadas primárias no interior do PS. Sem sucesso: Carlos César não aceitou a ideia. Adrião citou António Costa quando, em 2014, na altura em que desafiava a liderança de António José Seguro, viu a sua proposta de congresso extraordinário rejeitado: “Não há-de ser por razões estatutárias que não é devolvida a voz aos militantes e simpatizantes”. Mas a sua proposta não chegou a ser votada.

Topo apoia Marcelo, estruturas não 'compram'

As opiniões no PS têm-se mostrado divididas: se já vários nomes do topo da hierarquia socialista tinham avançado com o apoio a Marcelo, caso de Augusto Santos Silva ou Ferro Rodrigues, também Vieira da Silva e Edite Estrela terão, este sábado, tecido elogios ao presidente, durante a reunião da parte da manhã; à tarde, já depois de Pedro Nuno Santos, foi Fernando Medina, presidente da Câmara de Lisboa e outro dos nomes falados para a sucessão de Costa, quem reafirmou o apoio a Marcelo. Sem esquecer o momento em que António Costa, ao lado de Marcelo numa visita à Autoeuropa, antecipou que o presidente seria reeleito e depois, em entrevista ao Expresso, acrescentou que se não se recandidatasse geraria “um problema grave no conjunto do país, que dá isso por adquirido e se sente confortável com o Presidente”. Garantindo sempre que não "interferiria" neste debate, as posições foram entendidas dentro e fora do PS como um apoio implícito ao presidente.

Mas no aparelho socialista o apoio, mais ou menos assumido, a Marcelo não parece colar. Da ala mais à esquerda mas não só, são vários os nomes que se preparam para se colocar ao lado de Ana Gomes. O vice-presidente da bancada do PS João Paulo Correia não decidiu ainda quem irá apoiar, mas na reunião esclareceu que não escolherá Marcelo e que pondera apoiar Ana Gomes, reconhecendo até "mais virtudes" à candidatura da socialista do que à própria (por acreditar que no atual contexto - e com André Ventura na corrida - a diplomata representa uma "pedrada no charco" e vai "abrigar um conjunto de militantes e simpatizantes do PS", como tinha dito ao Expresso este sábado). E há deputados, como Ascenso Simões ou Isabel Moreira, que já optaram por se colocar ao lado de João Ferreira, candidato apoiado pelo PCP.

Perante a diversidade de opiniões, a líder parlamentar, Ana Catarina Mendes, quis sobretudo reforçar a importância de o partido não se dividir nesta fase, lembrando o historial do PS em presidenciais: "Já tivemos de tudo nas presidenciais. Nunca serviu para nos fraturarmos, serviu para nos unirmos", argumentou, defendendo a opção pela liberdade de voto sem assumir, para já, o apoio a nenhum candidato em particular.