A polémica entrevista do Presidente da República, esta semana, à RTP, onde se assumiu como “supremo responsável” pelos inúmeros “erros” que apontou à gestão da pandemia, não tranquilizam 100% os socialistas sobre o que poderão esperar de um segundo mandato deste Presidente. Marcelo limpou culpas do Governo junto de uma opinião pública cada vez mais dividida, mas nas entrelinhas deixou recados enigmáticos, a começar pela profecia segundo a qual se “contam pelos dedos os responsáveis políticos que em tempos de pandemia são reeleitos”.
O Presidente, a quem as sondagens antecipam uma reeleição folgada, falava sobretudo do Governo e do seu desgaste inevitável, que ilustrou com requintes históricos. Se Churchill ganhou a guerra e perdeu as eleições e Passos Coelho venceu a bancarrota e perdeu o poder, só por milagre é que António Costa resistirá aos danos políticos de uma crise sanitária, económica e social tão brutal como a que vivemos — “boa comparação com Churchill, mas não me sinto um Churchill”, respondeu Costa ontem de manhã à Antena 1, assumindo o desgaste que “a maior crise de sempre” provoca inevitavelmente no Governo. Somando a esse desgaste a fragilidade da maioria governamental que não se basta a si própria e a ausência de um acordo de legislatura que assegure, pelo menos, a viabilização dos Orçamentos do Estado, o que espera o mandato do próximo Presidente da República é uma enorme incerteza e instabilidade, com fortes probabilidades de ter de gerir uma crise política.