A análise cuidada da proposta de Orçamento do Estado para 2022 ainda terá de ser feita, mas a AEP- Associação Empresarial de Portugal já tem algumas opiniões formadas a partir do que se foi conhecendo sobre o documento nos últimos dias. E, no momento em que o ministro das Finanças, João Leão, entrega o orçamento na Assembleia da República, Luís Miguel Ribeiro, presidente da associação patronal admite que as suas expetativas, agora, são “francamente mais baixas” do que há algum tempo atrás.
“A AEP tinha forte expectativa de que o Orçamento do Estado para 2022 tivesse como foco políticas públicas de apoio ao potencial produtivo do nosso país, por serem as empresas que criam riqueza e postos de trabalho, condição essencial para se conseguir alcançar uma recuperação económica forte e sustentada. Contudo, face aquilo que vamos conhecendo, lamentavelmente as nossas expectativas são agora francamente mais baixas”, diz, deixando, no entanto, uma nota de abertura: “mantemos o benefício da dúvida, a bem do país”.
"Não há uma estratégia clara, integrada" de recuperação da economia
E quais são as principais “frustrações” da associação no momento em que o texto do Orçamento para 2022 entra na Assembleia da República?
“Do que se sabe até ao momento, não há uma estratégia clara e integrada, com medidas concretas para recuperar a atividade económica, melhorar a competitividade da economia portuguesa e relançar e reorientar o investimento – as três grandes prioridades que a AEP defendeu para o próximo Orçamento. Esta seria a estratégia correta, numa altura em que todas as previsões apontam para que no final deste ano o nosso PIB ainda estará abaixo do nível pré-pandemia”, sublinha.
Uma das preocupações dos empresários, destaca, é o aumento de despesa pública permanente (despesa corrente primária) e o consequente risco de mais carga fiscal no futuro. “Há uma elevada preocupação”, no que respeita a este ponto diz mesmo.
E o que devia estar no OE e não está? A lista avançada por Luís Miguel Ribeiro é extensa e cobre várias áreas: Reduzir a carga fiscal sobre as empresas e as famílias, eliminar diversas restrições que persistem ao bom desenvolvimento da atividade empresarial, como a redução dos custos de energia, entre outras, assegurar um processo de reforma do Estado, no sentido de inverter a elevada absorção de recursos pelo setor público, que conduz a uma carga fiscal insuportável, criar um forte estímulo ao investimento para a reindustrialização do nosso país e para a (re)qualificação dos ativos, assegurar compras públicas (bens e serviços) prioritariamente com elevado grau de incorporação nacional.
Desdobramento de escalões de IRS é positivo, mas....
É que “apesar de Portugal ter uma carga fiscal em máximo histórico, do que se conhece para o Orçamento não há qualquer desagravamento previsto ao nível do IRC, ainda que gradual, o que é inconcebível, tendo em conta que Portugal é o país da OCDE com a maior taxa máxima de IRC, incluindo as derramas estadual e municipal”, fundamenta.
“Também não se conhecem medidas no sentido da redução dos preços da energia (combustíveis e eletricidade), que penalizam fortemente a competitividade das empresas”, acrescenta.
Como ponto positivo, aponta a prevista atuação ao nível do desdobramento dos escalões do IRS, “no sentido de que tende a melhorar o rendimento disponível das famílias e é benéfico para o mercado interno, numa altura em que a procura ainda está relativamente débil”. No entanto, alerta, essa melhoria “poderá ser apenas aparente e ilusória, já que simultaneamente as famílias verão agravados outros custos que passarão a pesar mais no seu orçamento familiar, como os combustíveis, com impacto no seu poder de compra”.
E, “não nos podemos esquecer que a tributação sobre o trabalho só existe se houver trabalho, isto é, se as pessoas tiverem emprego. E aqui mais uma vez releva o papel das empresas, sendo que algumas das escassas medidas dirigidas às empresas são de eficácia muito reduzida ou ainda contraproducentes”.
E há fator dissuasor do mercado de capitais
Assim, apesar de destacar os previstos incentivos fiscais ao investimento como uma medida positiva, o dirigente associativo admite que a previsível eliminação do Pagamento Especial por Conta “poderá não ter grande relevância nesta altura”. “Apesar de ser uma medida defendida pela AEP há alguns anos, face às recentes alterações, nomeadamente a possibilidade da sua dispensa e de antecipação do reembolso integral e imediato da parte do pagamento especial por conta não deduzida até 2019, na prática faz com que esta eliminação a introduzir no OE22 não tenha grande relevância”, comenta.
Sobre o englobamento obrigatório no IRS das mais-valias mobiliárias até um ano, em vez de tributação autónoma, para o último escalão de IRS, por conduzir a taxas efetivas de imposto muito elevadas, diz que a sua confirmação “constitui um fator dissuasor do desenvolvimento do mercado de capitais”.