Henrique Monteiro

Cinco receios das consequências da crise

O Fed, o BCE, os bancos do Reino Unido, Suíça e Suécia, os governos de toda a Europa, incluindo o nosso, têm feito o possível para aplainar a crise em que vivemos. O futuro dir-nos-á se tiveram sucesso.

Mas as crises, que só são muito previsíveis depois de surgirem (pese o facto de muita gente ter avisado), têm consequências sociais e políticas que é bom não esquecer. Sem prejuízo de outras, ocorrem-me cinco que são particularmente preocupantes.

Em primeiro lugar, o desemprego. Já aí está em diversos sectores e actividades. A crise financeira passou para a economia real e as empresas estão a cortar custos. Como quase sempre, começam pelo marketing e publicidade e continuam por onde podem - os salários. O desemprego em massa, como drama social, aliado ao pessimismo de uma crise, tem em si mesmo um poder catastrófico que pode ser confirmado pela História.

Em segundo lugar, há o risco de muitas economias se entregarem nas mãos de fundos soberanos de países com regimes pouco recomendáveis. Este fim-de-semana veremos chineses e árabes, uns com o dinheiro da sobreexploração, outros com o do petróleo, a ajudar os EUA e a Europa. Regimes que dão cartas no gás e no petróleo, como o russo, na Europa, ou o angolano e o venezuelano, terão uma palavra a dizer. Ora, tudo isto se acabará por pagar. E não só em dinheiro, como é mais do que óbvio.

Em terceiro lugar, é temível que o poder económico se confunda com o poder político. É o que acontece nas ditaduras, é o que se passa na China, na Arábia Saudita e em muitas latitudes do mundo. O contrapeso de um poder em relação ao outro é inerente à liberdade.

Em quarto lugar, receio que os eleitores comecem a dar crédito àqueles demagogos que se dizem protectores dos fracos e dos oprimidos e possuidores de soluções milagrosas para as crises. É bom não esquecer que os totalitarismos mais bárbaros começaram na sequência de grandes crises.

Em quinto lugar, temo que, com a demagogia instalada, certos arautos da desgraça e, sobretudo, aqueles que mais perdem com a crise - desempregados, pensionistas, etc. - caiam na tentação de arranjar culpados. Foi assim ao longo de séculos e os culpados costumavam ser judeus, ciganos ou de um modo geral membros de uma minoria qualquer. É um clássico, mas não é por estarmos no séc. XXI que estamos livres.

Espero que estes receios sejam injustificados, mas nada melhor do que os revelar para que possam ser esconjurados.

Henrique Monteiro