Expandir o acesso ao ensino superior é uma ambição nobre, mas sem o devido investimento na qualidade da formação, corre-se o risco de transformar essa expansão numa prática meramente estatística.
A recente divulgação das vagas para o ensino superior em 2025/2026 gerou reações diversas. Se, por um lado, há um esforço inegável do Governo em ampliar o acesso ao ensino superior, por outro, subsistem interrogações quanto à sustentabilidade e eficácia desta estratégia. Aumentar vagas sem garantir condições para que os estudantes floresçam academicamente pode ser um exercício de ilusionismo político, com consequências nefastas para o futuro do país.
O aumento do número de lugares nos cursos de Educação Básica e Medicina, anunciado como um passo decisivo para mitigar a escassez de profissionais nestas áreas, merece um olhar atento. Não basta abrir portas; é essencial assegurar que, ao atravessá-las, os estudantes encontrem um ensino exigente, recursos adequados e uma perspetiva de futuro digna. Infelizmente, a história recente do ensino superior português demonstra que o aumento de vagas não tem sido acompanhado pelo necessário reforço de financiamento, infraestruturas e condições de trabalho para docentes e investigadores.
O caso da Educação Básica é paradigmático. Durante anos, assistimos à degradação da carreira docente, à precarização dos contratos e ao desinteresse crescente dos jovens pela profissão de professor. Agora, na tentativa de corrigir um erro que se arrasta há décadas, o governo decidiu criar mais vagas, como se o problema fosse meramente numérico. Mas quem quer ser professor num sistema que não valoriza os seus educadores? Sem uma reforma estrutural das condições de trabalho e de progressão na carreira, o aumento das vagas pode traduzir-se num crescimento da desistência e do desânimo.
Já no setor da Medicina, a inclusão de 86 novas vagas para estudantes internacionais levanta questões sobre a lógica que orienta esta política. A internacionalização do ensino superior é desejável e necessária, mas não pode transformar-se num subterfúgio para colmatar falhas estruturais. Se há necessidade de mais médicos em Portugal, por que razão não se aumentam as oportunidades para os estudantes nacionais? o Estado não pode encarar os cursos superiores como produtos num mercado global, mas sim como pilares de uma sociedade que valoriza o mérito e a equidade.
Por fim, a antecipação da divulgação das vagas é um avanço positivo, permitindo aos candidatos um planeamento mais consciente do seu percurso. No entanto, esta medida só será verdadeiramente eficaz se for acompanhada de um reforço da orientação vocacional e de mecanismos que combatam o abandono escolar no primeiro ano. Um ensino superior acessível não pode ser apenas uma porta aberta, mas sim um caminho com suporte adequado para que os estudantes possam concluir a sua formação com sucesso.
O ensino superior português não precisa apenas de mais vagas. Precisa de um compromisso sério com a excelência, com a equidade e com a valorização do conhecimento. Sem isso, corremos o risco de criar um sistema onde o número de diplomados cresce, mas o valor dos diplomas se esvazia. E esse, caros leitores, é um preço que o país não pode pagar.