Estamos a poucos dias da Marcha do Orgulho do Porto e a Câmara Municipal continua a impedir que o arraial que se segue à manifestação se faça no espaço onde devia realizar-se, à imagem do ano passado: o Largo do Amor de Perdição. Rui Moreira insiste também em recusar a alternativa que a Comissão Organizadora (que inclui 21 coletivos) propôs ao município: a Alameda das Fontaínhas. Nem sequer uma petição com milhares de assinaturas e vários apelos públicos demoveu o boicote do executivo da Câmara.
Não só a autarquia não dá um tostão para montar a estrutura do palco - o pedido correspondia a 1,4% (70 vezes menos) daquilo que a Câmara ofereceu a um evento comercial chamado Primavera Sound… - como está irredutível em querer encafuar a celebração do orgulho LGBTQI+ na quinta do Covelo, espaço periférico, murado, onde não cabem os participantes que estiveram no arraial em 2022, onde não existem condições de acessibilidade para quem tenha mobilidade reduzida nem condições de segurança para um evento desta dimensão.
Ao contrário do que acontece em centenas de cidades da Europa e de Portugal, desde logo em Lisboa e em várias autarquias do distrito do Porto, o presidente da Câmara do Porto vem teimosamente recusando também, nos últimos anos, que se possa hastear a bandeira arco-íris nos Paços do Concelho, com o argumento estapafúrdio de que o regulamento e o protocolo não o permitem. A desculpa é risível, porque quem é do Porto sabe bem que o mesmo edifício pôde ser recentemente iluminado com as cores da bandeira da Ucrânia em solidariedade com aquele país invadido ou decorado com pendões de fotografias da rainha de Inglaterra.
A bandeira arco-íris não pode estar ali, única e exclusivamente por razões políticas. Para os mais desatentos, é talvez nestes momentos que relembramos que, apesar das contradições internas, Moreira é o líder de um movimento que tem o suporte partidário do CDS e já teve presidentes de junta que se tornaram porta-vozes do Chega na cidade.
Susana Peralta foi rigorosa no que escreveu no Público a este propósito, mas logo Moreira respondeu no mesmo jornal, no estilo histriónico do seu chefe de gabinete, que a senhora Peralta era “portofóbica” e que ele “não recebia lições de progressismo”... Bem precisa. Criticar as escolhas políticas de boicotar o arraial e recusar hastear a bandeira não é portofobia, pela simples razão de que, felizmente, Moreira não é o Porto. Há milhares de pessoas que não se sentem representadas em decisões que apoucam a diversidade na cidade e que depreciam as minorias sexuais portuenses. Rui Moreira precisa, pois, de receber lições e de aprender a lidar com as críticas.
Além das decisões da bandeira e do arraial, Moreira serve-se de um avençado da embaixada de Israel que lhe lambe as botas no Observador para dizer que o Porto é muito plural e usa como desculpa esfarrapada para o seu boicote ao arraial deste ano um evento organizado por esse “empreendedor de palco” (uma figura já repudiada anteriormente pelos coletivos LGBTQI+ da cidade quando tentou invadir a Marcha com publicidade comercial, à margem da organização).
Ao mesmo tempo que é irredutível no boicote ao Arraial dos coletivos da cidade, momento de celebração da comunidade, de autofinanciamento da Marcha e de múltiplos serviços de utilidade pública (informação, testagem, aconselhamento), Moreira promove uma organização duvidosa que quer servir-se da causa para os seus negócios e agendas políticas e pessoais.
Não é a primeira vez que a Câmara se mete nestes berbicachos. Já no ano passado promoveu e apoiou um evento que tinha a mesma figura na organização, que se anunciou como “o maior evento LGBT de sempre em Portugal” e que acabou anulado, com artistas e detentores de bilhetes de mãos a abanar, ainda hoje a aguardar reembolsos. Moreira precisa mesmo de ser ensinado. Se começasse pelo progressismo já não seria mau. A Marcha do Porto é uma lição, mas o presidente da Câmara não quer aprender.